Enterro de Sindika Dokolo foi precedido por cerimónias em Angola, Congo e Inglaterra, transmitidas em direto durante cinco horas e meia pela Zap. Isabel não contou com a presença do pai.
Três capitais, três línguas diferentes para outras tantas missas e muitos hinos, músicas, mensagens e tributos. E uma grande produção da Zap, que transmitiu em directo cinco horas e meia de cerimónias intercaladas com um perfil laudatório.
Dezoito dias depois de morrer quando fazia mergulho no Dubai, Sindika Dokolo foi nesta terça-feira a enterrar em Londres, com exéquias a decorrer em simultâneo na República Democrática do Congo depois de terem começado em Angola.
Isabel dos Santos, a viúva, caminhou sozinha atrás do caixão, levado em ombros pela nave da catedral por funcionários de uma agência funerária ao som de um belíssimo Ave Maria entoado por um coro gregoriano. Nos bancos da frente esperavam-na os quatro filhos, a sogra e dois cunhados.
As filmagens não permitem identificar se Tatiana Kukanova, a mãe da que foi considerada a mulher mais rica de África e que vive em Londres, estava em Westminster, mas uma coisa é certa: a filha mais velha do ex-Presidente de Angola não contou com a presença do pai no Reino Unido, que também não esteve nos outros dois países.
José Eduardo dos Santos enviou uma mensagem formal de pêsames referida em Kinshasa (com o mestre de cerimónias a enganar-se numa primeira vez, chamando-lhe João dos Santos, Presidente de Angola) e reproduzida depois pela Zap, a operadora de televisão privada dominada por Isabel dos Santos (com 70%, tendo a NOS 30%) que emite para Angola e Moçambique e tem vários canais como o Zap Viva (onde foi feita a transmissão via YouTube “para todo o globo”, como disse o locutor — esta terça-feira à noite o vídeo contava com 21.894 visualizações).
O texto foi apresentado juntamente com as condolências enviadas pelo Presidente da Guiné-Bissau, as do Presidente da República do Congo ou as do primeiro-ministro de Cabo-Verde, depois da intervenção gravada do presidente da República Democrática do Congo, Félix Tshisekedi, país natal de Sindika Dokolo.
O pai de Isabel dos Santos escreveu em francês, dirigindo-se à “Mme [senhora] Hanne Dokolo” (a mãe do genro) e a “MME [assim mesmo, em maiúsculas] Isabel dos Santos Dokolo”. Começou por dizer que recebeu com “grande surpresa” a notícia da morte do “Dr Sindika Dokolo”, para depois acrescentar: “Trata-se de uma perda irreparável para a família e para todos nós. Foi um filho exemplar, um pai amoroso que sabia educar os seus filhos e também um marido exemplar”. José Eduardo dos Santos refere-o ainda como “homem culto e um grande patriota”, pelo que o “Congo perde um dos seus filhos mais ilustres”. E termina: “Apresento à minha família em luto as minhas condolências. Que o seu corpo repouse em paz”. No fim, assina: “Presidente José Eduardo dos Santos”.
Foi a primeira vez que José Eduardo dos Santos se manifestou publicamente sobre a morte do genro. A 30 de outubro colocou apenas uma fotografia de Sindika na sua página do Facebook e no dia seguinte, perante as centenas mensagens com os pêsames, publicou uma foto sua em Barcelona, ao lado de Sissoco Embaló, o Presidente da Guiné-Bissau, que o visitou, com um “muito obrigada”.
O dia fúnebre começou em Luanda às 9h00 na igreja de São Joaquim, na Praia do Bispo, em Luanda, e tinha os bancos todos preenchidos (com a devido distanciamento social devido à Covid-19), numa cerimónia bem mais simples do que a de Kinshasa. Contou com um quarteto masculino (nem sempre muito harmonioso) nos hinos e o testemunho emocionado de um familiar de Sindika.
A cerimónia de Kinshasa foi mais exuberante e longa, apesar da chuva: decorreu no Museu Nacional da República Democrática do Congo e, para além da missa, contou com muitos testemunhos, discursos e muita música, desde um grupo coral até uma solista e um dos cantores preferidos de Sindika Dokolo, Lokua Kanza.
O momento mais solene deu-se na sobriedade e no silêncio da catedral de Westminster, em Londres, de onde partiu o corpo de Sindika Dokolo para o cemitério. Profusamente decorada com arranjos gigantes de flores nos mesmos tons dos que estavam em Luanda e Kinshasa, a igreja foi a que teve menos presenças, cerca de umas trinta pessoas, devido à Covid, disse o padre, “mas que contava com a assistência de muitas pessoas de Angola, Congo, Moçambique e Portugal e de todo o mundo” através do YouTube .
Coube à filha mais velha do casal, cujo nome em kigongo significa Grandeza, segundo contou um amigo do pai (os outros nomes dos filhos significam Alegria — filho de Sindika de uma relação anterior à da Isabel —, Independência, Guia e Protegido e Rodeado de amor) ler uma mensagem importante. A jovem, que contrariamente à mãe não usou nenhuma máscara ou viseira, leu as palavras que os irmãos escreveram sobre o pai num inglês perfeito e a de um amigo num impecável francês. O filho mais novo disse que tinha saudades do pai: “Sinto a tua falta papá, gostaria de poder brincar contigo outra vez. Queria rir contigo. Feliz Halloween”.
Para além desta filha e da irmã de Sindika (fez a primeira leitura bíblica), Isabel dos Santos, visivelmente emocionada, também participou, fazendo a oração dos fiéis: rezou por Sindika, pela família e pelos amigos de Sindika, por África: “Para que tenhamos força para os desafios e que possa crescer para o seu potencial e que estejamos preparados para dar a nossa ajuda”.
Da catedral o caixão partiu para o cemitério dentro de uma carrinha fúnebre, sendo acompanhado por meia dúzia de carros. Já no local, Isabel e os filhos seguiram a pé atrás do caixão enquanto a Zap ia passando em rodapé mensagens de figuras públicas, como Naomi Campbell, entrecortando as imagens das campas com a do amigo Lokua Kanza, que em Kinshasa interpretava Wapi Yo — um impressionante lamento cantado.