“Se surgir um ditador num país deve ser afastado de imediato, através de todos os meios, porque não é bom para o seu povo e para nós. A ditadura é um perigo para o ser humano”, adiantou o académico.
O historiador israelita Gideon Greif manifestou esta segunda-feira em entrevista à Lusa escasso otimismo sobre o atual estado do mundo, expresso no falhanço em combater os ditadores, e considerou que a Bíblia permanece uma fonte decisiva do conhecimento.
“Penso que 3.000 anos não são suficientes para mudar o nosso caráter básico, e nesse aspeto não sou muito otimista. O falhanço em combater os tiranos e ditadores… O facto de no século XXI ainda existirem ditadores como na Coreia do Norte e outros países, porque os ditadores não matam apenas os outros, mas também o seu próprio povo“, afirmou à Lusa o investigador na Ono Academic College, uma universidade privada na cidade de Kiryat Ono, distrito de Telavive.
“Se surgir um ditador num país deve ser afastado de imediato, através de todos os meios, porque não é bom para o seu povo e para nós. A ditadura é um perigo para o ser humano”, adiantou o académico, que em 2019 liderou uma equipa de investigação responsável por um extenso relatório recentemente divulgado sobre os acontecimentos de Srebrenica em 1995, e que contesta a existência de um genocídio na sequência da conquista do enclave pelas forças sérvias bósnias.
O seu escasso otimismo pelo atual estado do mundo sugere-lhe o recurso à Bíblia, a uma frase do Velho Testamento, do Génesis, que considerou ser a melhor resposta.
“Diz que a natureza do homem desde o seu nascimento é negativa. Já em bebés temos más intenções, é uma expressão bíblica. A Bíblia é sapiente, e se a Bíblia diz tenho de acreditar”.
Gideon Greif, especialista na história do Holocausto, entende a vida como uma batalha permanente “entre as más intenções e as boas intenções, que todos temos”, e que para alguns nunca será um confronto bem-sucedido. “A maior parte das pessoas ultrapassa estas tendências porque não podemos ser pecadores ou criminosos toda a vida, temos de ultrapassar essas tendências, se podermos, se quisermos. Nem todas as pessoas o querem”.
Na sua perspetiva, o mundo atual não regista grandes progressos face às “más intenções” em particular de quem usufrui do poder, e em comparação décadas já passadas.
“Há uma grande similitude entre vida privada e vida pública. Se aprendermos através da nossa vida privada, com os nossos erros, aprendemos a evitar repeti-los. O mesmo acontece com os países ou as sociedades. Temos de olhar para trás, ver o que fizemos de errado e não o repetir. Sempre cometemos erros, mas nunca repetir o mesmo erro duas vezes, apesar de ser difícil… Podemos aprender muito pela Bíblia, é muito importante”, esclareceu.
Ao reivindicar a sua função de historiador, Gideon Greif evita, no entanto, pronunciar-se sobre o presente, em particular sobre o prolongado conflito israelo-palestiniano.
“Nos últimos 50 anos nunca me pronunciei com situações relacionadas com política, porque os historiadores lidam com o passado, é o nosso privilégio. Quando chego ao presente, deixo de ser historiador, pode-se perguntar a qualquer pessoa na rua”, justificou.
“Posso falar do conflito israelo-palestiniano há 100 anos, conheço muito bem, mas não me pronuncio em relação ao presente ou futuro porque não se enquadra na nossa profissão. É o nosso privilégio. Os historiadores recolhem e analisam documentos do passado, o presente o futuro não são a nossa área”, continuou.
No entanto, e num regresso a um passado mais próximo, define a fundação do Estado de Israel, em 1948, como um “milagre”.
“Após 2.000 anos de diáspora, não foi apenas o regresso à nossa antiga terra, mas falar a mesma língua dos nossos antepassados. Imagine-se, se o profeta Isaías saísse do seu túmulo falaria um hebreu antigo, mas poderíamos comunicar”, sublinhou com ênfase. “É um milagre, 2.000 anos depois falar a mesma língua e construir nesse deserto um lugar maravilhoso. É um milagre e podemos estar orgulhosos disso. Tenho orgulho em ser israelita, e judeu”, frisou.