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Juíza Conselheira do Tribunal Constitucional (TC) admite que privação de liberdade em Angola tem “muitas vezes” atalhos distanciados da Constituição

A Juíza conselheira do Tribunal Constitucional de Angola Maria da Conceição Sango admitiu hoje, em Lisboa, que a decisão de aplicar ou manter a privação de liberdade “muitas vezes tem trilhado atalhos distanciados” da Constituição, no seu país.

“De forma objetiva, a valoração da dignidade humana e liberdade do arguido na decisão de aplicação ou manutenção da privação da liberdade, muitas vezes tem trilhado atalhos distanciados de uma jurisdição verdadeiramente constitucionalizada”, afirmou Maria da Conceição Sango na sua intervenção no congresso sobre “Liberdade, Meio Ambiente e Justiça”, inserido nas comemorações dos 190 anos do Supremo Tribunal de Justiça português e organizado em parceria com a Comunidade de Juristas de Língua Portuguesa.

Para a juíza conselheira, desse distanciamento decorrem “tensões dialéticas, e até muitas vezes dilemáticas, a que são colocados os operadores judiciários, entre privação da liberdade-liberdade, face ao andamento do processo”, defendendo que aqueles “não devem jamais suspender o juízo constitucional na ponderação, de modo que os direitos fundamentais do arguido não fiquem desproporcionalmente prejudicados”.

Segundo Maria da Conceição Sango, os cidadãos têm procurado o Tribunal Constitucional “para solicitar a sindicância de decisões judicias que determinam medidas restritivas de liberdade, reputadas inconstitucionais, enquanto mecanismo que visa a efetivação dos direitos fundamentais e, naturalmente, da dignidade da pessoa humana”.

Assim, disse “o Tribunal Constitucional tem apreciado e decidido muitos recursos de decisões cuja discussão jurídica assenta essencialmente” em questões como “prazo de prisão preventiva, pressupostos da prisão, e situação carcerária do arguido após condenação em primeira instância, estando pendente recurso”.

Na sua intervenção, a juíza do Tribunal Constitucional de Angola afirmou que “o controlo jurisdicional das medidas de coação não deve distanciar-se da dosimetria necessária entre a necessidade da medida de coação restritiva da liberdade e a tutela da dignidade da pessoa humana”.

Lembrando que a Constituição da República de Angola consagra, no seu artigo 57.º, que a lei só pode restringir direitos, liberdades e garantias nos casos previstos expressamente naquela lei fundamental, Maria da Conceição realçou que “a restrição deve limitar-se ao necessário, a salvaguarda de outros direitos protegidos, igualmente, pela Constituição”.

Em Angola, admitiu, o direito processual penal é considerado por muitos como um “sismógrafo da Constituição”, daí que “têm sido constantes os pedidos de intervenção do Tribunal Constitucional para sancionar questões de confluência constitucional, penal e processual penal, de que é exemplo o “habeas corpus”.

Segundo a jurista do Constitucional angolano, a Lei 25/15 de 18 de setembro revogou uma primeira lei sobre a prisão preventiva e aprovou a Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal, “introduzindo princípios da necessidade, proporcionalidade, subsidiariedade e adequação, enquanto pressupostos para aplicação das medidas de coação em processo penal, já há muito firmados na dogmática processual penal”.

Referiu uma sucessão de princípios que “deveriam ser observados na aplicação das medidas de coação, nomeadamente: legalidade ou tipicidade, princípio da adequação, o princípio da proporcionalidade e o da solidariedade”.

Mas, segundo a responsável do Tribunal Constitucional, aquela “já surgiu com algumas deficiências de parto, sobretudo no que às medidas restritivas de liberdade diz respeito, designadamente, a atribuição de competências ao Ministério Público para, em fase de instrução, aplicar medidas cautelares restritivas de liberdade (…); a imprecisão legal da situação carcerária em que deveria se encontrar o arguido após condenação em primeira instância, e haja interposto recurso e os prazos de prisão preventiva se achassem esgotados”.

Além disso, “a par de algumas insuficiências intrínsecas da lei, a própria prática judiciária não acompanhou de todo a evolução do pensamento legislativo, ancorado no valor constitucional da presunção de inocência e dignidade humana do arguido e detido, e foram sendo aplicadas muitas medidas de coação privativas da liberdade, de justificação duvidosa”, adiantou.

Segundo Conceição Sango, “muitas das medidas que eram aplicadas, além de terem sido suportadas em fundamentação abstrata, tinham como farol da sua determinação o crime e a pena aplicável. Os juízos da necessidade, adequação, proporcionalidade e precariedade só raras as vezes são concretizados nas decisões que impõem restrições à liberdade”.

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