Mathias Alencastro frisou que o Presidente do Brasil promove, desde que assumiu o cargo, o primeiro governo “antilusófono” da história, tendo “consequências imediatas na própria existência da CPLP”.
O analista brasileiro Mathias Alencastro considera que o Brasil tem, pela primeira vez, um Governo ‘antilusófono’ e dificilmente cumprirá a recente promessa de se engajar mais na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Investigador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e doutor em ciência política pela Universidade de Oxford, Alencastro frisou que o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, promove desde que assumiu o cargo o primeiro Governo ‘antilusófono’ da história na medida em que “nunca reivindicou a aliança tradicional com Portugal, nunca reivindicou a presença do Brasil em África”, e acrescentou que isto “tem consequências imediatas na própria existem da CPLP”.
Numa viagem à Portugal concluída no início deste mês, o ministro das Relações Exteriores brasileiro, Carlos Alberto Franco França, assegurou o Brasil quer reforçar seu papel na CPLP e destacou a importância dos valores da organização lusófona, “partindo da ampla base geográfica que tem a CPLP, agora reforçada pela quantidade de observadores [associados]”.
Questionado sobre a possibilidade destas intenções se tornarem realidade, o investigador do Cebrap reconheceu que o ministro tenta normalizar as relações Exteriores do país muito deterioradas pelo ministro que o antecedeu no Governo Bolsonaro, mas considerou que tal intenção dificilmente se concretizará.
“Acho que não podemos esperar nada do Governo. Vimos que as iniciativas que o Itamaraty [Ministério das Relações exteriores do Brasil] teve em relação a China, de pacificar um pouco as relações com Pequim, foram imediatamente sabotadas pelo vandalismo verbal do Presidente da República”, disparou.
“Não podemos esperar nada do Governo [do presidente, Jair] Bolsonaro, sobretudo nas relações com Portugal porque é um Governo que tinha um projeto ultraconservador de política externa, um projeto exotérico populista que envolvia Israel, a Polónia, os Estados Unidos, e que entrou em colapso com a derrota do [ex-presidente americano Donald] Trump. O Brasil nunca substituiu este projeto”, completou.
Segundo o investigador, que recentemente lançou uma coletânea de artigos num livro chamado “Brazil-Africa Relations in the 21st Century: Surge to Downturn and Beyond”, (Relações Brasil-África no século 21: do crescimento à desaceleração e além), junto com o Pedro Seabra, professor-associado do Instituto Universitário de Lisboa, nesnte momento, um ano antes das próximas presidenciais brasileiras, será muito difícil esperar que o país reconstrua uma politica externa baseada nos eixos tradicionais da diplomacia.
Alencastro também instou Portugal a manifestar-se em favor da democracia no Brasil, que ele considera ameaçada pelo Governo Bolsonaro, e a deixar o que classificou de uma “posição de neutralidade” neste momento conturbado das relações lusófonas.
“Portugal optou por uma neutralidade táctica em relação ao Bolsonaro, que terá custos para diplomacia portuguesa no Brasil. O facto de Portugal não ter se manifestado uma única vez contra as ameaças autoritárias do Governo Bolsonaro (…) optar por ficar numa zona de conforto, numa neutralidade, foi um sinal de fraqueza da parte de Portugal”, conclui o investigador.