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Moçambique: Presidência da CPLP garante que Cabo Delgado continua na “agenda da organização”

O embaixador de Cabo Verde em Portugal, Eurico Monteiro, falou à DW África em nome da presidência cabo-verdiana da CPLP e respondeu às críticas relativamente à “inércia” da organização face à situação em Cabo Delgado.

Cabo Verde vai propor na próxima cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em julho, o reforço de instrumentos de resposta a situações de emergência como a de Cabo Delgado, a norte de Moçambique.

O presidente da Casa de Moçambique em Portugal, Enoque João, defende a criação de uma unidade militar conjunta envolvendo forças da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), da União Africana (UA) e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), com a missão de bloquear a ação de grupos terroristas na região de Cabo Delgado.

“Criar aqui uma força de bloqueio conjunto, porque os ditos insurgentes vêm dos países da SADC. É ali onde reside o problema. Esta é uma das soluções que eu penso que seria a mais importante. E não é forçar o Governo de Moçambique a aceitar a intervenção militar da CPLP, mas sim aceitar que alguns militares da CPLP se juntem na estratégia de estancar as várias fronteiras que Moçambique tem com os Estados que deixam passar os insurgentes”, explica.

Envio de militares da CPLP

Enoque João é a favor do envio de militares da CPLP, nomeadamente de Portugal, para o treinamento do exército moçambicano. O presidente da Casa de Moçambique criticou a inércia da CPLP diante do drama dos deslocados em Cabo Delgado, afirmando que a organização estaria mais virada para negócios e menos preocupada com crise humanitária.

“É que a CPLP, ao invés de discutir a livre circulação de bens e de pessoas no espaço lusófono em Angola, no corrente ano, devia levar em agenda – e como Cabo Verde é mentora dessa presidência – a situação de Cabo Delgado em Moçambique. [Por outro lado], Portugal é responsável, enquanto membro da CPLP e enquanto hoje assume a presidência da União Europeia, pela situação que se vive em Cabo Delgado. Aquilo é um genocídio humano”, lamenta.

Por sua vez, Eurico Monteiro, embaixador de Cabo Verde em Portugal, que fala à DW África em nome da presidência rotativa da organização, contestou as críticas, sublinhando que a situação em Cabo Delgado continua na agenda da CPLP em vários níveis.

“Um primeiro nível é esse esforço de sensibilização da comunidade internacional para o problema e de suscitar apoios em alinhamento com as necessidades de Moçambique expressas pelas autoridades moçambicanas, designadamente todo o apoio político na cena internacional, todo o apoio logístico, de formação, tudo aquilo que é absolutamente necessário para auxiliar as forças de segurança em Moçambique na defesa do seu território e também na defesa das populações”, enumera.

Concertação político-diplomática

Noutro plano, acrescenta, a CPLP tem desenvolvido concertação político-diplomática estreita com os Estados membros para incentivar a cooperação bilateral em assuntos militares. O diplomata lembra, em reação a tais críticas, que a organização não tem mecanismos diretos e específicos que lhe permite atuar no território de um Estado membro.

“Nós não somos propriamente uma organização de vocação conflitual, paramilitar ou para a defesa. A CPLP é uma organização de promoção da língua portuguesa e uma instância, sobretudo, de concertação político-diplomática entre os Estados. Isso não significa que não haja até instrumentos de cooperação na área da defesa, mas não é propriamente com a vocação de intervenção desta natureza”, lembra.

No entanto, Eurico Monteiro admite a necessidade de se rever e reforçar os instrumentos que a CPLP tem de apoio a situações de emergência, o que implicará a criação de mecanismos mais abrangentes que tenham em conta respostas às catástrofes naturais e outras situações emergenciais como as que se vive em Moçambique.

“Portanto, para situações de emergência entre os Estados já existem alguns mecanismos, mas que podem ser afinados, reforçados e, nalguns aspetos até, revistos para poderem ser mais abrangentes. Estou absolutamente consciente, por aquilo que têm expressos os diversos Estados membros, que esta matéria será retomada de uma forma mais coerente e consistente na cimeira de Luanda a 17 de julho, em Angola”, diz.

Questão humanitária e de sensibilização

Em resposta ao apelo lançado pelos municípios moçambicanos afetados, a União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA) promoveu um encontro virtual, esta quinta-feira (08.04) para debater medidas de apoio a Moçambique. O seu secretário-geral, Vítor Ramalho, diz que as reações às propostas das 55 cidades associadas são encorajantes face às necessidades.

“Aqui é uma questão de facto humanitária e de sensibilização. Concretamente, a ideia que eu tenho é de, eventualmente, a própria UCCLA criar um pequeno vídeo – uma vez que hoje o impacto nas redes sociais é muito maior do que aquele que era tradicional nos media normais – para que haja a nível internacional uma grande divulgação para reforçar a consciencialização da situação que ocorre em Cabo Delgado”.

O dirigente da UCCLA lembra os cargos internacionais relevantes ocupados por figuras lusófonas de destaque como António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, e António Vitorino, que dirige a Organização Internacional das Migrações, entre outros de outras áreas geográficas, cujo papel pode influenciar mais apoios para Moçambique.

“Há aqui a conjugação de um conjunto de astros que neste momento possibilitam que essa chamada de atenção a nível internacional e a interlocução, mesmo do ponto de vista da ajuda alimentar, possa ser mais consequente, através do PNUD e de outras instituições como a Organização Internacional das Migrações por causa do aumento exponencial de refugiados naquela zona”.

O apelo lançado à UCCLA partiu de Manuel Araújo, presidente do Município de Quelimane, que, através de uma carta, exortou o apoio dos membros e parceiros da União em vários continentes para minimizar o impacto dos ataques terroristas nos municípios afetados.

“Eu penso que a UCCLA tem valências e capacidade para influenciar organizações estatais e não estatais. Aproveitando essa caraterística peculiar, essa riqueza, essa diversidade que a UCCLA tem, nós podemos como autarcas, como edis, dar a nossa contribuição para minimizar o impacto, mas também contribuir para a resolução deste conflito que afeta mais de 700 mil pessoas deslocadas e não só”, diz.

Araújo precisa, em declarações à DW África, que o terrorismo afeta uma grande parte da população de Moçambique, não só nas zonas atingidas diretamente pela violência, tal é o caso da província da Zambézia, onde estão acantonadas centenas de pessoas que fugiram dos ataques de grupos fundamentalistas islâmicos.

 

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