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Portugal: Angola gasta mais na “defesa e segurança” do que na “educação e saúde”

No Orçamento Geral do Estado 2020 revisto, o governo começou por dizer que ia gastar 1,7 biliões Kz com as escolas e os hospitais e 1,2 biliões Kz com os quartéis e as esquadras. Acabou por gastar 2 biliões Kz com a defesa e seguranças e apenas 1,5 biliões Kz com a educação e a saúde, de acordo com a execução orçamental. Uma história que se repete desde 2018.

Angola continua a gastar mais com a defesa e segurança do que com a educação e saúde contrariando as promessas do governo que nos orçamentos de 2018, 2019 e 2020 prometeu que ia gastar mais com as escolas e hospitais do que os quartéis e as esquadras, de acordo com uma investigação do Mercado.

A título de exemplo no Orçamento Geral do Estado (OGE) 2020, o governo começou por dizer que ia gastar 1,7 biliões Kz com a educação e a saúde (12,5% dos gastos totais) e 1,2 biliões Kz para a defesa e segurança (8,7%). Mas as previsões saíram furadas- De acordo com a execução orçamental publicada pelo ministério das Finanças o governo gastou 2,0 biliões Kz em defesa e segurança (18% do total) mais 73,6% do que o orçamentado. Com as despesas com a educação e a saúde aconteceu o inverso, ficaram-se pelos 1,5 biliões, 10,6% abaixo do previsto no orçamento.

Para a educação, o Executivo previa uma despesa de 870 mil milhões Kz, mas executou cerca de 845 mil milhões, enquanto para saúde projectou uma despesa de 816,7 mil milhões Kz e gastou 663 mil milhões.

Já para defesa, o governo previa gastos na ordem dos 586, 1 mil milhões Kz e gastou efectivamente 1,1 biliões Kz, ao passo que para segurança e ordem pública orçamentou 589, 2 mil milhões e gastou 967, 9 mil milhões.

Em termos globais, o orçamento 2020 previa receitas e despesas estimadas em 13 455 mil milhões Kz, mas a execução ficou-se pelos 11 004,8 mil milhões Kz, 18,2% abaixo do orçamentado.

Feitas as contas, em 2020 a fatia das escolas e hospitais chegou aos 13,7% do bolo (7,7% para a educação e 6% para a saúde), enquanto a fatia dos quartéis, das esquadras ultrapassou os 18%.

Para este ano, o Executivo elaborou um orçamento com gastos globais estimados em 14,8 biliões Kz, dos quais 1,9 biliões para educação e saúde (12,7%), e 1,3 biliões para defesa e segurança e ordem pública (9%). A execução dirá se a promessa será cumprida.

Angola subscreveu acordos que recomendam metas concretas para os gastos com a educação e saúde. Em 2000, em Dakar, Senegal, acordou-se que os países deviam dedicar 20% das despesas públicas totais para a educação. Em 2001, a Declaração de Abuja, Nigéria, acordou-se que as despesas com a saúde deveriam representar 15% do orçamento. Ou seja para se conformar com as recomendações internacionais o Governo precisa de mais do que duplicar o esforço relativo com a educação e a saúde.

O Presidente João Lourenço prometeu chegar à meta dos gastos de 20% na Educação e 15% na Saúde até 2022.

Gastos com defesa têm componente social

“Essas diferenças [entre o que foi executado e o orçamentado] provam que o orçamento de pouco ou nada serve, visto que, sistematicamente, a execução não respeita o orçamento”, disse o economista Heitor Carvalho em declarações ao Mercado.

“Tal facto acontece porque existem toda uma série de mecanismos legais que permitem ao Executivo fazer letra morta do que é disposto na Lei Orçamental, criando um outro Orçamento, do Executivo, que é completamente desconhecido dos cidadãos e dos seus representantes”, explicou.

Sobre os gastos com a educação e saúde, alertou que “uma escola ou um hospital não é um conjunto de paredes com o nome Escola ou Hospital na entrada. Se não tiver professores, carteiras, seringas, médicos, enfermeiros, e tudo o mais não passarão de paredes. Um qualquer investimento exige que haja, em permanência, a despesa corrente necessária para que funcionem e durem o tempo previsto”.

“Se nós temos escolas e escolas que não funcionam, hospitais e hospitais que não funcionam para quê fazer mais e termos ainda mais escolas e hospitais que não funcionam?”, questionou.

“O investimento necessário deve ser, antes de mais, em colocar em funcionamento o que existe, não em fazer mais coisas para inaugurar e esquecer. Claro que concordo que se priorizem estes sectores mas ao nível da despesa corrente e não de mais investimentos, pelo menos até se alcançar um nível mínimo de utilização do que já temos”, defendeu.

“Os números mostram que a prioridade é para a defesa e segurança e que a educação e a saúde são secundárias”, constatou. Contudo, notou “que parte da defesa são gastos sociais. Continuam no activo muitos militares que participaram nos combates, isto é, na história do País e que merecem o máximo respeito da sociedade e do Estado; e não sei onde são contabilizadas as reformas dos militares: se estão na defesa acho que estão mal”.

“Os gastos da defesa com antigos participantes nos conflitos devem ser totalmente isolados e transferidos para o apoio social. Feito isso, a despesa com a defesa não pode ultrapassar muito os 3% da despesa primária total”, garantiu.

O também director do Centro de investigação económica da universidade Lusíada de Angola (Cinvestec) realça que a segurança pública é uma função social, tão importante como a saúde e a educação. Contudo, “deve estar virada exclusivamente para a defesa dos cidadão e não para a defesa do Estado e deve garantir que todos durmam tranquilamente sem serem importunados no seu sono, se desloquem em total segurança de e para o trabalho e que as empresas deixem de necessitar de contratar seguranças privados aumentando os nossos custos de produção e diminuindo a nossa competitividade”, ressalvou.

“Este domínio do poder executivo (que devia executar a Lei e abster-se de fazer lei, mas que o nosso sistema jurídico-constitucional torna legal) é um entrave forte para o ambiente de negócios porque permite, sem aviso e discussão alterar o quadro normativo, afastando o investimento honesto e atraindo os aventureiros que procuram enriquecimento fácil e sem riscos”, garantiu.

“É necessário e urgente que este quadro legal seja substituído pelo princípio da independência do poder legislativo que deve caber em exclusivo à AN. Os investidores não votam, mas investem. Podemos evocar todos os argumentos jurídicos que queiramos para manter o actual estado de coisas; os investidores vão responder, como têm respondido, deixando de investir. Como diria um poeta: depois não digam que não vos avisámos”, concluiu.

 

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