O início do ano de 2020 ficou marcado pelos processos de litígio entre a empresária angolana Isabel dos Santos e o Estado português após a investigação internacional feita por jornalistas no âmbito do projeto Luanda Leaks.
O desenvolvimento mais recente debruça-se sobre as garantias públicas dadas por Angola à filha do ex-Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, para a compra da multinacional portuguesa Efacec, que está agora sob controlo do Governo português. Em causa está a dívida contraída pela empresária à banca portuguesa, nomeadamente através do Novo Banco (NB), do Banco Comercial Português (BCP) e da Caixa Geral de Depósitos (CGD).
Estas instituições financeiras interpuseram ações contra a empresa Winterfell, de Isabel dos Santos, o que poderá levar o Estado angolano a pagar 30 milhões de euros devido à garantia dada pela Empresa de Distribuição de Electricidade de Angola (ENDE) para a compra da Efacec pela Winterfell.
“Julgo que este é um processo que vai ser longo e que não facilita a vida à empresária Isabel dos Santos”, comenta Rosália Amorim, diretora do Diário de Notícias.
O Estado português pretende relançar a multinacional Efacec, que foi nacionalizada, e reprivatizá-la. “Isabel dos Santos recorreu à justiça pedindo a impugnação da nacionalização, que considerou discriminatória. Ora bem, este braço de força continua, mas julgo que qualquer ação que venha agora a ser tomada na atual circunstância, e considerando a informação existente, não deve ser entendida como uma divergência entre o Estado português e o Estado angolano e qualquer dúvida será seguramente dirimida em sede própria, ou seja na justiça”, refere a jornalista.
O problema das pessoas politicamente expostas
Segundo o deputado Jorge Costa, co-autor do livro “Os Donos Angolanos de Portugal”, a execução da garantia pública angolana sobre os empréstimos de bancos portugueses às empresas de Isabel dos Santos é mais um caso demonstrativo do perigo que as relações financeiras com pessoas politicamente expostas representa para os Estados e para os contribuintes.
“Surpreende adicionalmente pelo facto de os bancos portugueses já conhecerem o caso anterior do Banco Espírito Santo (BES), quando tomaram a decisão de vir emprestar a Isabel dos Santos nestas condições”, frisa o parlamentar português.
Quanto à Efacec, o deputado do Bloco de Esquerda e também jornalista estima que “os prejuízos acabarão por cair, como parece ser o caso, na conta dos contribuintes angolanos, uma vez que é o Estado angolano, através da ENDE, que deu a garantia sobre estes empréstimos à Isabel dos Santos, a filha do ex-Presidente da República”.
Neste contexto, Jorge Costa afirma que “a banca portuguesa teve também um comportamento profundamente condenável”.
Para o analista, os bancos privados devem ser cuidadosos nas relações com pessoas politicamente expostas, sabendo de antemão que as relações de promiscuidade com o poder eram gritantes.
A analista Rosália Amorim considera, por último, que o mais importante em todo este processo é que a Efacec – que sempre foi uma das mais prestigiadas empresas portuguesas – seja relançada para recuperar competitividade.
“É uma companhia importante em matéria de emprego qualificado no Norte do país, assim como em matéria de centros de competências, tecnologia e exportações que Portugal não quer perder”, adverte.