A fuga à paternidade influencia no número de crianças e adolescentes nas ruas frias da capital do Moxico, Luena. Para acudir a fome, muitas vendem resíduos plásticos que encontram em contentores de lixo.
Em trocs de um quilo de arroz, crianças e adolescentes tornam-se estafetas na descarga de produtos diversos de um contentor de lixo em Luena. As desavenças no seio familiar fazem com que as crianças vão viver na rua, referenciou a líder da Organização da Mulher Angolana (OMA), na província do Moxico, Juliana Uini.
“Um casamento são gera filhos sãos. Ao contrário, casamento com desavenças gera filhos que vão à rua a procura de sustento, o que não é normal – principalmente nesta fase de pandemia em que nos encontramos. Os pais devem ser responsáveis pelos seus atos, não permitir às crianças pernoitarem na rua, salvaguardando o futuro delas”, avalia.
Evaristo é um menino de 13 anos de idade. Acompanhado dos seus dois irmãos mais novos, conta que recolhe e vende plástico para garantir o sustento da família.
“Viemos procurar plástico para vender. Basta pesar um quilo e nos vão pagar 100 Kwanzas [menos de um euro]. Com o dinheiro que ganhamos compramos comida”, relata o petiz.
Fuga à responsabilidade
Sobre a fuga à paternidade, o jurista e docente universitário Augusto Tomás defende maior contundência das instituições de direito na resolução do problema.
“É pertinente que as instituições sociais sejam mais contundentes a agirem positivamente contra este mal”, considera.
Augusto Tomás apela aos pais e encarregados de educação “a tomarem maior atenção, cumprindo com as suas obrigações, prestando alimentos aos petizes – sem se esquecer do Estado que, como um ente coletivo, tem a obrigação devida, pelo que se lhe apela a criar melhores condições e melhoramento das políticas sociais, por forma a mitigar paulatinamente este mal”.
Crianças a viver na rua
A província angolana do Moxico tem apenas um centro social de reintegração, o Lar Ana Jetu pertencente à Igreja Católica, que acolhe crianças e adolescentes abandonados. O centro tem capacidade para cerca de 150 pessoas, mas alberga atualmente 19 crianças por falta de camas e outros meios. O coordenador Francisco Viegas revela que só na cidade de Luena cerca de 300 crianças vivem na rua.
“Se a Igreja Católica não pusesse sempre a mão, este lar desapareceria”, afirma.
Indignado e incrédulo, o sociólogo João Pedro considera a situação “uma lástima e uma vergonha para a província do Moxico”.
“Sendo uma das províncias mais populosas de Angola, com tantas crianças abandonadas, não é concebível que tenha apenas um lar de acolhimento. O Executivo angolano deve criar centros de acolhimento e reintegração das crianças e adolescentes desfavorecidas, bem como implementar o subsídio de desemprego para que os pais não se refutem das suas responsabilidades por falta de meios financeiros“, conclui.
A DW África solicitou uma reação ao Instituto Nacional da Criança, mas o responsável não aceitou prestar declarações.