Residentes, activistas sociais e líderes religiosos continuam a denunciar o aumento da fome em várias regiões de Angola, devido à seca, mas também à falta de programas do Governo. Líder religioso, autoridade tradicional e produtor agrícola descrevem situação lastimável no Sul, mas alertam que alastra-se a outros regiões.
Se até há pouco o grito provinha do Sul do país, agora as denúncias surgem da Lunda Sul e, por exemplo, do município da Ganda em Benguela, onde os produtores deixaram de trabalhar porque a produção é roubada na calada da noite pelos munícipes que alegam fome.
No Cunene, a situação de fome é tão grave que, segundo o padre da Igreja Católica Gaudêncio Félix, há mesmo pessoas a morrerem em consequência da falta de comida, enquanto outras fogem para a vizinha Namíbia.
“Encontrei pessoas que estão há dois, três dias sem comer, algumas a morrerem mesmo, outras até podem não perder a vida imediatamente, mas a sua esperança de sobrevivência é reduzida, a comida que se está distribuir não chega para nada, não é possível sobreviver com três quilos de fuba durante meses, com famílias de 10 membros”, diz aquele líder religioso para quem “é uma pena o nosso Executivo ignorar o apelo dos bispos para decretar estado de emergência no sul do país”.
“Infelizmente, vamos assistindo à incapacidade do mesmo Executivo em resolver o problema da fome e vemos pessoas a fugirem para a Namíbia à procura de melhor sorte”, lamenta Gaudêncio Félix, quem também alerta para o aumento do crime.
“Os roubos aumentaram, a delinquência, e vão aparecendo cada vez mais crianças abandonadas pelas próprias famílias, é uma situação triste”, conclui aquele padre.
Mais a leste, na província da Lunda Sul, o cenário não é diferente, como diz o Soba Kapemba.
Ele lembra que como tudo vem de Luanda e as estradas para aqui não favorecem, com a alta dos preços dos principais produtos, a fome aperta e a solução encontrada por alguns é a marginalidade.
“A pobreza aumenta por estas paragens, os jovens passam o tempo na rua a pedir, durante o dia e de noite há roubo, muitos assaltos, as pessoas já não conseguem dormir tranquilas, cresce a miséria, as pessoas, por causa da fome vão ficando doentes”, conta aquela autoridade tradicional.
O empresário e produtor nacional Rui Magalhães afirma que na região da Ganda, na província de Benguela, a fome está quase por todo o lado.
Magalhães revela que há tanta fome na Ganda que os agricultores locais preferem parar a pouca produção, por causa dos roubos.
“Durante a noite, as pessoas são capazes de roubar quase uma tonelada de produtos do campo, a polícia não tem capacidade de intervenção, o empresário só vê uma saída, que é parar a produção”, sublinha aquele produtor que destaca uma grave situação de insegurança.
Desde há meses, activistas sociais pediram ao Governo que declare o estado de emergência no Sul do país na sequência da pior seca que há 40 anos abate sobre Angola, pedido também feito pela Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST) em Outubro.
O Governo não respondeu positivamente, mas o Presidente criou uma equipa de trabalho para enfrentar a situação no Sul, há dois anos, mas até agora não há qualquer informação sobre o trabalho que tem vindo a efectuar.