A organização não-governamental (ONG) Friends of Angola considerou hoje que “as violações dos Direitos Humanos e da Constituição” do país estão a ter como efeito “obviamente propositado, a deterioração com recurso ao terror da estabilidade política e social”.
O alerta consta de uma carta aberta dirigida ao Presidente da República de Angola, João Lourenço, sobre “Obstruções ao Exercício do Direito à Manifestação em Angola”.
A Friends of Angola (FoA) salienta que foi com “grande preocupação” que recebeu as notícias sobre “as mais recentes agressões e detenções em Luanda” de 22 jovens manifestantes no passado dia 09.
“Entre as pessoas detidas estavam três senhoras e uma criança de sete meses. As provocações, agressões e detenções aconteceram quando as cidadãs e cidadãos se preparavam para se manifestarem com o propósito de exigir a ‘libertação de presos políticos, o afastamento da empresa INDRA das eleições gerais de 2022 e o fim do conflito militar em Cabinda”, lê-se na carta aberta.
Segundo a FoA, os cidadãos que se preparavam para iniciar a manifestação, conforme o que está previsto na legislação aplicável, “reuniram-se pacificamente e sem armas”, tendo consigo “apenas telemóveis e identificação pessoal”.
A ONG cita o Auto De Notícia emitido pela Delegação Provincial de Luanda do Ministério do Interior, segundo o qual os jovens e uma criança de sete meses foram detidos “por terem incorrido na prática dos crimes de participação em motim (…) e de desobediência à ordem de dispersão de ajuntamento”, conforme previsto no Código Penal angolano.
Na carta aberta, assinada por Florindo Chivucute, diretor executivo da FoA, a ONG considera que “as violações dos Direitos Humanos e da Constituição” têm como efeito, que classificam como “obviamente propositado, a deterioração com recurso ao terror da estabilidade política e social”.
“Essa deterioração tem um caráter evidentemente subversivo e efeitos extremamente graves por decorrer da prática daqueles que estão investidos do poder e do dever de salvaguardar a ordem, proteger as pessoas e as instituições”, sublinha a FoA.
A ONG chama a atenção para o facto de a “subversão da ordem democrática constitucionalmente estabelecida” decorrer quando o país “se encontra num momento muito sensível”, com o atual período pré-eleições gerais, agendadas para agosto, e que a FoA antecipa que decorrerão “num ambiente de elevadíssima tensão política”.
Nesse sentido, a organização “exige que as competentes autoridades judiciais angolanas e a comunidade internacional iniciem investigações rigorosas com o objetivo de levar a tribunal os mentores, mandantes e executantes da provocação policial, agressão e detenção abusiva de manifestantes pacíficos” no passado dia 09 de abril.
“A impunidade não deve poder continuar a ser garantida a oficiais e agentes da Polícia Nacional que, com evidente propósito político, vêm cometendo abusos de autoridade contra cidadãs e cidadãos”, destaca a FoA.
“Esses oficiais e agentes devem ser investigados, acusados e julgados pelas violações dos direitos humanos que vêm cometendo e que, enquanto agentes servidores do Estado, devem ser as primeiras pessoas a respeitar e defender, fazendo com que o respeito pelos direitos humanos seja efetivamente garantido a todas as cidadãs e cidadãos angolanos e ou residentes em Angola”, sublinha a ONG.
A sentença do julgamento dos jovens ativistas será conhecida hoje, segundo a defesa.
Segundo o advogado Simão Afonso, dos 22 jovens, que estão a ser julgados desde segunda-feira pelo Tribunal da Comarca de Luanda, cinco não são manifestantes e estão a ser acusados do crime de realização de motim e desobediência à ordem de dispersão, acusações que a defesa contesta, alegando que estes tinham a autorização para a realização da manifestação.
Simão Afonso disse que a maior parte dos manifestantes foram detidos no largo do Cemitério da Santa Ana, onde se encontravam “apenas para realizar uma manifestação que foi autorizada”.
O partido angolano Bloco Democrático (BD), na oposição, repudiou as detenções, bem como a Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), organização não-governamental angolana e a Human Rights Watch (HRW), que exortou as autoridades angolanas a “abandonarem imediatamente as acusações criminais” contra os 22 manifestantes.