A agência de notação financeira Moody’s considerou hoje que a evolução das negociações com a China sobre o alívio da dívida será determinante para o ‘rating’ e alertou que a diversidade de credores prejudica as reestruturações.
“Uma base de credores mais dispersa, incluindo detentores de títulos de dívida soberana e uma presença crescente de credores chineses, alargou as opções de financiamento para os países da África subsaariana, mas esta dispersão também está a complicar as negociações de reestruturação da dívida, incluindo o alívio de liquidez no contexto da pandemia”, alertam os analistas.
Numa análise aos países da África subsaariana – entre os quais a Moody’s analisa os lusófonos Angola e Moçambique -, enviada aos clientes e a que a Lusa teve acesso, os analistas escrevem que, “devido ao papel cada vez mais importante dos bancos chineses como credores na região, a sua participação em futuras reestruturações de dívida, e os derradeiros termos acordados vão ser determinantes na evolução dos perfis de crédito de vários países nesta região”.
Na nota, a Moody’s dá vários exemplos das relações pouco transparentes entre os bancos chineses e os governos africanos, incluindo com Angola, um dos principais parceiros do gigante asiático em África.
“A falta de transparência, em parte devido às cláusulas de confidencialidade nalguns contratos, e a publicitação sobre o montante de dívida aliviada, complicam as negociações com os outros credores relativamente ao alívio de liquidez”, dizem os analista desta agência de ‘rating’.
“Em abril, Angola anunciou que estava perto de um acordo com credores chineses para adiar 7 mil milhões de dólares em pagamentos de dívida até 2022”, lembra a Moody’s, admitindo que “uma extensão das maturidades da dívida bilateral, particularmente a devida aos bancos chineses, traria um significativo alívio de liquidez num contexto de preços baixos do petróleo, fracas receitas fiscais e uma moeda depreciada, que agravaram o grande peso da dívida de Angola”.
No entanto, alertam, “desde então não houve mais nenhum anúncio, e as negociações sobre alívio da dívida ainda não foram concluídas”.
A Iniciativa da Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI), lançada pelo G20 em abril, com o apoio do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, “provou ser pequena em comparação com o total das obrigações de serviço externo da dívida, e cobre apenas uma pequena parte do défice de financiamento externo”, diz a Moody’s.
A agência nota ainda que, até agora, os países da África subsaariana não abordaram os detentores de títulos de dívida para beneficiarem de alívio de liquidez, a não ser a Zâmbia, cuja consequência foi a descida do ‘rating’ por parte das três agências de notação financeira, que alertam que qualquer tentativa de reestruturação da dívida privada teria como consequência uma degradação da opinião sobre a qualidade do crédito e, consequentemente, o afastamento dos mercados internacionais devido à subida quase automática dos custos de endividamento.
Na nota sobre as consequências do aumento da presença chinesa no sistema financeiro africano, a Moody’s alerta que “nos últimos anos, a resposta dos bancos públicos chineses aos países africanos que enfrentaram pressões de liquidez não foi uniforme nem transparente”.
A Moody’s reconhece que “há evidências de alguma boa vontade dos credores chineses para renegociarem os empréstimos, aliviarem as enormes pressões orçamentais e da balança de pagamentos”, mas ainda assim alerta que “a falta de divulgação, consistência e previsibilidade à volta das condições destas reestruturações significam que as implicações de crédito para os países africanos são menos claras”.
De acordo com os dados da Moody’s, no final de 2019 Angola teria de pagar cerca de 5,6 mil milhões de dólares em pagamentos sobre a dívida externa este ano, o que representa cerca de 8% do PIB.
A composição da dívida de Angola revela que 51% da dívida é devida a credores comerciais, principalmente chineses, ao passo que as emissões de dívida pública representam menos de 20% do total, estando o resto dividido entre credores bilaterais (13%) e multilaterais e fornecedores (9% do total cada).