Jovem morreu na sequência dos protestos de 11 de novembro, em Luanda. Família vai para tribunal e oposição pede um inquérito. Três ativistas foram detidos quando se preparavam para ir a uma vigília.
Ao início desta noite, a polícia deteve três ativistas que se dirigiam ao Largo da Sagrada Família, em Luanda, o local para onde estava agendada uma vigília em memória do jovem Inocêncio Matos. Ao que a DW apurou, entre os ativistas detidos está Laurinda Gouveia, do conhecido grupo de revolucionários 15+2. Desconhece-se ainda o seu paradeiro. A vigília foi cancelada, o largo estava a ser vigiado pela polícia.
A morte de Inocêncio Matos gerou uma onda de revolta, dentro e fora de Angola. Tanto a oposição como organizações de defesa dos direitos humanos, como a Human Rights Watch (HRW), condenaram a violência policial usada nos protestos de quarta-feira e pediram um inquérito.
“Os disparos da polícia contra manifestantes pacíficos são revoltantes e criminosos”, escreveu em comunicado Zenaida Machado, investigadora sénior da HRW.
A família do jovem prepara-se agora para processar a polícia pela morte. “Neste processo a ser levado a cabo, também será responsabilizado o Governo angolano porque a Polícia Nacional é um órgão pertencente ao nosso Governo”, afirmou o advogado Zola Bambi, da equipa de defesa, em declarações à DW África.
A polícia negou qualquer responsabilidade na morte do jovem. A equipa médica que o atendeu no hospital disse que ele terá morrido depois de ser atingido por um “objeto contundente”, como um pau ou um ferro. Mas, segundo o advogado Zola Bambi, há versões contraditórias apresentadas por testemunhas, que devem ser investigadas.
Balas reais?
Nas redes sociais, ativistas estão a divulgar supostos cartuchos de balas que teriam sido utilizadas contra as pessoas que protestavam. No entanto, a polícia angolana nega ter usado balas reais na manifestação.
O comandante provincial da polícia em Luanda, Eduardo Cerqueira, disse na quarta-feira (11.11) que, se a corporação usasse balas reais, seria “um genocídio”.
“A polícia utilizou apenas meios não letais que são próprios para esse tipo de evento”, assegurou.
Mas, para o advogado Zola Bambi, os pronunciamentos da polícia quanto ao uso de balas reais “são infelizes” tendo em conta que “o facto foi presenciado por muita gente e haviam muitos telefones a filmar e testemunhas oculares”.
Lopes Francisco, um dos jovens que presenciou a morte de Inocêncio Matos, garante que as balas usadas não eram de borracha.
“O comandante provincial diz que as balas foram de borracha, mas não são. Quando levámos o nosso irmão, já não tinha vida”, afirmou.
Vários desaparecidos
Entretanto, continua a haver relatos de manifestantes desaparecidos depois dos protestos de quarta-feira. Os organizadores ainda estão a contabilizar o número de pessoas e prometem dados concretos nos próximos dias.
Esta sexta-feira (13.11), um jovem dado como desaparecido no dia 11 de novembro, reapareceu. Uma fonte familiar disse à DW África que o jovem esteve numa espécie de “cadeia” e apresenta sequelas de tortura.
“Enquanto fugia da polícia, ele e outros sete jovens foram surpreendidos por um carro do Serviço de Investigação Criminal (SIC) que os levou quase à província do Bengo. Naquele lugar desconhecido, ele e os outros foram postos num cativeiro, onde foram abandonados. Não se sabe o que queriam fazer com eles. Durante esses dias de cativeiro, foi espancado e até está com o braço ferido.”
A ONG Friends of Angola (FoA), sediada dos Estados Unidos, insiste na necessidade de abrir uma investigação ao que sucedeu em Luanda, a 11 de novembro, para levar os responsáveis por abusos à Justiça.
“Estamos preocupados pelo facto de esta situação ter ocorrido durante uma manifestação que é salvaguardada pela Constituição da República. Esses direitos não podem ser cancelados pelo Presidente da República. Há algumas exceções, mas nenhuma situação que vivemos põe em causa esse direito constitucional”, disse à DW África o diretor-executivo da FoA, Florindo Chivucute.
“Também lamentamos o facto de, até agora, o Presidente angolano não ter se manifestado em relação à morte do jovem manifestante”, acrescentou.