Angola: “Mais de 12 mil funcionários” da casa de segurança do Presidente sem salário há quatro meses

Mais de 12 mil funcionários da Casa de Segurança do Presidente da República estarão sem salário há quatro meses. Estima-se que impasse afete quase 70 mil pessoas e muitas famílias já denunciam situação de fome.

Mais de 20 integrantes da Unidade de Segurança do Presidente da República, João Lourenço, foram presos no âmbito da Operação Caranguejo, liderada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Durante a operação, foram encontradas avultadas somas de dinheiro num contentor na província angolana do Cuando Cubango.

As irregularidades levantadas pela operação envolviam Pedro Lussaty, major da Unidade da Guarda Presidencial. Manuel Correia, comandante provincial da Casa de Segurança do Presidente da República, e Atanásio Lucas José, presidente do Cuando Cubango Futebol Club, estão entre os detidos por suspeita de peculato, retenção de moedas e associação criminosa.

Quatro meses depois, cerca de 12 mil efetivos ligados à Casa de Segurança do Presidente da República de Angola em Luanda, Kwanza Norte e Cuando Cubango permanecem com as contas congeladas e sem salário. O drama afeta um universo de mais de 70 mil pessoas.

“Desde que começámos a ser cadastrados no mês de julho nunca mais tivemos os salários e as contas estão cativas”, disse à DW África um funcionário que pediu anonimato.

“Nós somos pais de família, pedimos que se venham pronunciar e dar o devido tratamento a estas pessoas porque não são animais. Imagine como esta família fica quatro meses sem salários?”, questiona.

Criminalidade a aumentar?

Outro funcionário, que também não quer ser identificado por temer represálias, informou que muitos dos seus colegas estão a vender as suas residências por estarem em situação de fome.

“Nós temos crianças que tentámos colocar nos colégios, mas foram expulsos por não estarmos a pagar a propina. Estamos a ver que aumenta cada vez mais o índice de delinquência no país”, adverte.

Este funcionário confirma que está a passar fome e que a situação de penúria se repete com os seus colegas.

“Somos milhares de pessoas e milhares de famílias. Muitos de nós estamos com uma responsabilidade de dez a quinze pessoas sobre a nossa tutela. Pedimos aos órgãos de direito que cheguem pelo menos até nós e que nos deem um esclarecimento”, acrescentou.

Sem salário em plena crise

O sociólogo Ovídio Fernando Tchicala não lamenta a fiscalização feita à Casa de Segurança do Presidente da República, mas pede que os órgãos responsáveis considerem a situação das famílias.

“Deixar nesta altura um pai sem salário torna-se mesmo muito complicado para gerir a família”, comenta referindo-se à crise económica associada à pandemia da Covid-19.

“Desde que o país entrou em crise, houve muitos movimentos de greve”, relata. “São militares, que por natureza da sua formação, do perfil caracterizado pela obediência e disciplina, são estes que se estão a manifestar, quer dizer que alguma coisa está mal”.

A DW África contactou o porta-voz da PGR para saber se o congelamento e falta de salário é parte da investigação para a instrução processual, mas não obteve resposta ao pedido de entrevista.

 

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