Perante os “maus tratos” e a “miséria” crescente dos trabalhadores angolanos, manifestações para exigir a revisão da Lei Geral do Trabalho estão no horizonte das centrais sindicais.
Os sindicatos afirmam que a atual Lei Geral do Trabalho acarreta muitos constrangimentos à estabilidade de emprego de muitos angolanos. A legislação beneficia mais o empregador em detrimento do empregado, dizem os sindicalistas, que em dezembro discutiram a hipótese de realizar uma greve geral. Até agora, a medida foi descartada para facilitar as negociações com o Governo de João Lourenço.
Mas a insatisfação dos trabalhadores continua a aumentar: num país em que a inflação está cada vez mais alta e com o preço da cesta básica a disparar nos mercados, o salário do angolano não serve para as despesas das famílias, segundo os sindicalistas.
Em entrevista à DW África, o secretário-geral da Central dos Sindicatos Independentes e Livres de Angola (CGSILA), Francisco Jacinto, afirma que os atos de massa – que já têm data marcada e deverão ser anunciados em breve – visam mudar o estado atual dos trabalhadores das empresas públicas e privadas que ainda fazem “trabalhos indecentes”.
“Reitero isso e tenho reiterado que o trabalho, hoje, em Angola, é um trabalho escravo”, sublinha o sindicalista. “Só não diz isso aquele que não conhece Angola, ou aquele que sabe e sente-se acomodado por qualquer outra iniciativa pessoal, não cumprir aquilo que lhe foi dado pelos trabalhadores. Dizem defender os trabalhadores, mas na verdade fazem outras coisas. Esses não podem dizer a verdade”.
Francisco Jacinto considera que o trabalhador angolano nunca viveu em paz em função do custo de vida no país: “É preciso destacar que o trabalho não digno assenta em dois eixos fundamentais – os maus tratos a que os trabalhadores são submetidos todos os dias e os péssimos salários que auferem”, explica.
Para o sindicalista, “não se admite, num país considerado o mais caro do mundo, ter um salário mínimo na Função Pública de 33 mil kwanzas [cerca de 41 euros], quando o Governo ainda tem dificuldade em garantir água ao trabalhador”.
Rever a lei para acabar com a miséria
O secretário-geral da CGSILA considera que os trabalhadores estão submetidos à miséria. Na província do Huambo, trabalhadores da empresa de saneamento básico estão a procurar comida nos contentores de lixo devido ao atraso salarial de sete meses, reportou a Rádio Eclésia.
O testemunho é de uma funcionária angolana à emissora católica de Angola: “Temos colegas que por falta de salário, neste momento, se encontram nos contentores [do lixo] Estamos sem os salários há sete meses. Não é fácil um ser humano suportar sete meses sem salário. Sentimos pelos colegas que estão a comer nos contentores. Sente pelos outros, mas não consegues ajudar porque estás sem salário, como o colega que está a comer no contentor”.
Há quatro meses, as organizações sindicais submeteram à Presidência da República uma proposta de revisão da Lei Geral de Trabalho. Até agora, não houve nenhuma resposta.
A sindicalista Filomena Tomás, da União dos Trabalhadores Angolanos-Conferência Sindical, (UNTA-CS) afirma que os trabalhadores angolanos não têm proteção social.
“Quando se cria uma lei de trabalho, os operadores de justiça devem ter em conta o trabalho digno”, sublinha. “O trabalho digno significa que tem que haver produtividade, tem que haver remuneração condigna, tem que haver liberdade e proteção no local de trabalho. E, no entanto, os trabalhadores não têm proteção”.
“Partindo do pressuposto que eles trabalham até quinze anos e não têm direito à segurança social, não têm direito à reforma e esses quinze anos de trabalho, essa contribuição para que serve?”, questiona. “Vai para os cofres do Estado e os trabalhadores não têm se quer proteção no trabalho e na doença. Nós, os sindicalistas, consideramos que esta lei não é protetora e deve ser revista”, defende Filomena Tomás.
O inspetor-geral do Trabalho do Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social (MAPTSS), Vacilo Agostinho disse à Rádio Nacional de Angola que a revisão da lei deve ser feita com base num estudo mais aprofundado: “Se há ou não, necessidade da sua alteração, temos que fazer os estudos. A lei é de 15 de junho de 2015, de lá para cá, estamos há seis anos de vigência desta lei”.