Angola: Um almoço de reconciliação nacional “sem o líder da UNITA”?

O líder da oposição, Adalberto Costa Júnior, ficou de fora da lista dos convidados do Presidente João Lourenço para um evento de celebração dos 19 anos de paz e reconciliação. Críticos falam em intolerância política.

Esta sexta-feira (02.04), o Presidente angolano, João Lourenço, promove um almoço de confraternização no Jardim do Palácio Presidencial, no âmbito das comemorações do 4 de abril, dia da Paz e da Reconciliação Nacional. Entre os convidados nota-se a ausência dos líderes dos partidos da oposição – com destaque para o presidente da UNITA, Adalberto Costa Júnior. No seu lugar, João Lourenço convidou o ex-presidente do partido do Galo Negro, Isaías Samakuva.

Segundo o Jornal de Angola, estarão no evento promovido pelo chefe de Estado figuras históricas da Luta de Libertação Nacional. Além do atual líder do maior partido da oposição, estão também ausentes na lista os líderes da CASA-CE e do PRS e membros da sociedade civil e da comunidade religiosa. A DW África tentou, sem sucesso, obter esclarecimentos junto do Secretário do Presidente da República para os Assuntos de Comunicação Institucional e Imprensa.

Para o jornalista e analista político Ilídio Manuel, o ato mostra que João Lourenço passa a ideia de que o seu relacionamento é melhor com o anterior presidente da UNITA e não com o atual. E é um mau presságio para a efeméride: “Isto calha mal num dia como este, porque o Dia da Paz implicaria passar a ideia junto da sociedade de que há uma vontade das pessoas se aproximarem. Há uma vontade dos líderes políticos ultrapassarem as suas diferenças”, considera. “Quando isso não acontece, ficamos com a ideia de que há uma série de egos, pode ser das duas partes, e com estas situações, não conseguimos avançar”.

Desvalorização e intolerância

O analista político Wilson Calunga não tem dúvidas: a exclusão de Adalberto Costa Júnior representa uma desvalorização da figura do líder da oposição angolana. “Sendo a UNITA um partido com um papel fundamental neste processo de paz em Angola, ninguém melhor que o presidente deste mesmo partido para representar os demais”, sublinha.

“Não sei quais foram os critérios, mas penso que não caiu muito bem o fato de não constar da lista dos convidados do evento de reconciliação nacional o presidente do maior partido da oposição”, conclui.

Para o secretário provincial do Partido de Renovação Social (PRS) no Huambo, Solia Selende, o Presidente angolano promoveu um ato de intolerância política ao divulgar a lista dos seus escolhidos. “A exclusão, por exemplo, dos presidentes Adalberto Costa Júnior (UNITA), Manuel Fernandes (CASA-CE) e Benedito Daniel (PRS), demonstra que o Presidente da República tem inimigos e não tem adversários”, afirma. “Se são, de facto, adversários políticos no jogo da democracia, eles deviam sentar-se à mesma mesa para conversarem e refletirem a paz e criarem a verdadeira reconciliação nacional”.

Imprensa tem culpa no cartório?

A exclusão do líder da UNITA gerou particular polémica, numa altura em que a imprensa angolana tem vindo a noticiar fatos negativos sobre Adalberto Costa Júnior, sem, no entanto, permitir contraditório nos seus espaços noticiosos. A UNITA fala mesmo numa campanha de difamação contra o seu líder, apontando o dedo ao Governo.

O jornalista Ilídio Manuel considera que, nos últimos anos, o processo de reconciliação tem sido fragilizado pela imprensa estatal – que acusa de ser promotora dos atos de intolerância política em Angola. “É na comunicação social pública que há uma seleção de pessoas que se não estiverem ligadas ao partido no poder, não são abordadas para emitirem as suas opiniões. Isso também é um caso de intolerância política”, frisa.

O problema passa também pelas redes sociais, acrescenta, “embora seja espaço de debate, mas há determinadas pessoas, sobretudo aquelas que já são influentes na sociedade, não toleram as críticas ou são muito contrárias a pessoas que criticam o poder ou que criticam a postura de determinados partidos políticos”.

Apelo ao fim da guerra em Cabinda

Esta quinta-feira (01.04), numa mensagem proferida por ocasião do Dia da Paz e da Reconciliação Nacional, Adalberto Costa Júnior afirmou que a paz celebrada em abril de 2002 não é ainda a “justa e duradoura” intencionada pelos negociadores da paz em Bicesse, a primeira geração dos patriotas angolanos que combateram pela liberdade.

O líder da UNITA apelou ao fim do conflito armado no enclave de Cabinda: “A paz democrática exige que Angola pare com a guerra em Cabinda e inicie imediatamente o diálogo. A democracia tem formas de solucionar reivindicações regionais, históricas, ou sociais no quadro do Estado unitário de Angola. É preciso parar com a guerra e dialogar. Não se pode celebrar a paz em Luanda enquanto se faz guerra em Cabinda. Não se pode celebrar a paz no Cunene e ativar bazucas e morteiros contra cidadãos no Cafunfo ou em outros lugares só por pensarem diferente”.

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