Os acidentes de viação, com destaque para os atropelamentos, continuam a ser a segunda causa de morte em Luanda, depois da malária, que causa anualmente milhares de mortes.
No primeiro semestre de 2021, o departamento do trânsito do Comando Provincial da PN registou 674 acidentes por atropelamento, a maioria dos quais fora das pedonais e passadeiras, com um acréscimo de 453 com relação ao mesmo período de 2020, com 286 mortes, mais 206, e 469 feridos, mais 299.
As vias mais visadas continuam a ser as avenidas Fidel Castro, Pedro de Castro Van-Dúnem e 21 de Janeiro, a rua principal da Samba, a Revolução de Outubro e a número 100/Norte.
De acordo com uma fonte oficial, de quatro a 10 deste mês foram registados no país 170 acidentes, igual número ao assinalado no período de 2021, com 34 mortos, mais sete e 215 feridos. Um acréscimo de 49 casos, uma média de 24 acidentes, cinco mortos e 31 feridos por dia.
Desta cifra 57 acidentes foram por atropelamento com 15 mortos e 56 feridos.
A província de Luanda liderou com 49 acidentes e 11 mortos, correspondente a 29 e 30 por cento, respectivamente.
Os atropelamentos registam-se com frequência na periferia da cidade, com realce para os municípios de Belas, Talatona, Kilamba Kiaxi, Cazenga, Cacuaco e Viana.
Referiu que a livre circulação de pessoas e bens, fruto das medidas de desconfinamento da Covid-19, permitiu o aumento do número de acidentes.
Impacto e custos dos acidentes de trânsito
Os acidentes de trânsito estão entre as principais causas de morte em Angola, além de serem apontados como um grande problema de saúde pública, podendo deixar sequelas graves, com implicações físicas, psicossociais e económicas nos indivíduos envolvidos, disse o sociólogo Abel Chico.
A fonte referiu que em Luanda os custos dos acidentes são mais sociais e psicológicos, para além das condições hospitalares limitadas, das faltas relacionadas ao trabalho, as indemnizações e os gastos materiais que geram.
De acordo com uma vítima, que ficou hospitalizado durante 45 dias depois de ter sido atropelado embaixo de uma pedonal na Avenida Deolinda Rodrigues, na zona da Robaldina, município de Viana, em Luanda, a situação é angustiante.
Medo, angústia, incerteza e inaptidão física foram alguns dos sentimentos que José Gouveia, de 34 anos, experimentou na pele depois do atropelamento, há três mês.
Disse que por pressa de atravessar a avenida e de alguns segundos de desatenção foi atropelado, embaixo de uma pedonal.
“Irresponsavelmente, tentei atravessar embaixo da pedonal, quando olhei para frente, vinha uma carrinha, não consegui desviar e acabei colhido pelo veículo”, lembra, “fui levado inconsciente em estado gravíssimo”.
Graças ao atendimento rápido e eficiente no Hospital Américo Boavida, mesmo em tempo de pandemia da Covid-19, o jovem foi salvo e hoje pode apresentar o seu relato de consciencialização e alerta sobre a importância e necessidade de utilizar as pedonais e passadeiras.
“Hoje só consigo ser grato e dar valor à minha vida e à família. Tive a oportunidade de viver de novo”, conta o jovem, que ficou sete dias entubado na Unidade de Terapia Intensiva.
O impacto do embate causou-lhe lesões no abdómen e nos braços, para além dos joelhos.
Apesar de ter sobrevivido, mesmo depois da alta hospitalar, não consegue mais andar normalmente e continua a receber acompanhamento de fisioterapia, para recuperar os movimentos da perna.
“Mesmo tendo uma recuperação considerada rápida pela equipa médica de cubanos e angolanos, hoje só consigo andar com muletas, porque a reabilitação e a recuperação de um acidente de trânsito é um processo lento”, relata.
A médica Sandra Gomes refere que as sequelas causadas pelos atropelamentos, geralmente, são muito graves e chama a atenção principalmente para os casos dos adultos que acabam com sequelas irreversíveis por causa de traumatismos.
Sandra Gomes, que chama a atenção para a prevenção de acidentes graves, adianta que “quanto menos pessoas desconcentradas ou alcoolizadas circularem nas ruas, menos acidentes e atropelamentos serão registados”.
Policia de trânsito
O chefe de departamento da Direcção de Trânsito e Segurança Rodoviária do comando de Luanda da Polícia Nacional, superintendente-chefe Adriano do Rosário, esclarece que o Código de Estrada, em vigor, prevê que as pessoas efectuem a travessia nos locais a eles destinados (passadeiras de nível superior/ pedonais ou de nível pavimento), isto na alínea número 3 do artigo 97 do CE.
Aliás, acrescentou, sempre que ocorre um acidente de viação existe um causador. O acidente deve ser bem investigado para se apurar o causador e o lesado. Acrescentou que há casos em que o causador pode ser o condutor ou o peão.
Referiu que encontrar o causador depende das circunstâncias. “Vamos entender que o peão atravesse fora da passadeira. Perguntar-se-á qual é a velocidade que levava o veículo (…). Por isso, é relativo, podendo também haver culpa de ambos”, explicou.
Um levantamento feito pelas autoridades da saúde, em Luanda, refere que a faixa etária que apresenta o maior número de pacientes traumatizados no trânsito fica entre os 18 e os 40 anos, representa 64 por cento dos atendimentos desse tipo, a sexta-feira e sábado, entre às 13h e 22hs, o período mais visado.
Comportamento seguro para os peões
O especialista em viação e trânsito rodoviário, Mateus Neto, diz que o motorista deve ter mais cuidado com as crianças e idosos.
No trânsito, as pessoas cumprem diversos papéis, para com os cidadãos, quando estão dentro dos veículos seja ligeiro ou pesado, moto ou bicicleta, disse.
Na sua opinião, o motorista deve actuar com segurança, apostar numa condução defensiva e atenta, usando o capacete ou o cinto de segurança, isso para todos os ocupantes.
Ressaltou que o peão deve cuidar da sua segurança e andar com muita atenção, pois não possui acessórios ou equipamentos de protecção contra as situações de risco que enfrenta no dia-a-dia, no trânsito, sendo importante respeitar as placas de sinalização e passadeiras, bem como utilizar as pedonais, para prevenir acidentes.
Ver e ser visto
A principal regra para os peões, segundo o especialista, é estar atento ao movimento dos veículos e certificar-se de que também foi visto pelos motoristas. É preciso fazer contacto visual com o condutor para certificar-se que ele identificou a sua presença.
Manuel Alexandre, outro especialista em Segurança Rodoviária, aconselha que o peão ande sempre pelo passeio e afastado da estrada. Em estradas ou avenidas sem passeios, que o peão caminhe mais a esquerda possível, no sentido oposto aos dos carros para poder ver e ser visto.
Se estiver a levar sacolas, procure carregá-las do lado oposto ao da via. Quando acompanhado de mais pessoas, ande pela fila e evite caminhar ouvindo música através de fones de ouvido, pois para além de diminuir a atenção, o peão deixa de ouvir os ruídos que podem indicar a aproximação de um veículo.
O peão não deve sair a correr pelas ruas, nem mesmo nos passeios. O peão deve estar sempre atendo para poder parar a qualquer momento, aconselha.
Impacto negativo na economia
Para o economista Barnabé dos Santos, a sinistralidade rodoviária para além de afectar directamente as famílias e empresas, em termos de invalidez e mortes, tem um impacto económico negativo no Produto Interno Bruto (PIB).
Realçou tratar-se de um fenómeno complexo com vários factores que contribuem para o impacto negativo da economia e para as famílias.
Como disse, o importante é que as organizações da sociedade civil e as autoridades concebam campanhas que tenham um grande impacto, perspectivando mudança de comportamento.