A Comissária para a Agricultura e Economia Rural da União Africana (UA), a angolana Josefa Sacko, afirmou hoje em Adis Abeba que qualquer aposta eficaz na produção agroindustrial necessita de um continente pacificado, o que não acontece atualmente.
Falando à margem da 36.ª cimeira da União Africana (UA), a dirigente explicou que a comissão para a Agricultura está “a trabalhar em estreita colaboração com o departamento de paz e segurança” para se ter um programa que assegure investimentos a longo prazo, apesar do recrudescimento dos conflitos inter-regionais no continente.
Em resposta à Lusa, a comissária Josefa Sacko reconheceu que a situação alimentar em África é agravada pelos conflitos no continente e que qualquer investimento estrutural em Agricultura necessita de um clima de segurança que hoje não existe.
“Não é tão fácil gerir as duas coisas juntas mas temos que as gerir, porque realmente estes conflitos armados e políticos, mas também comunitários”, numa referência à transumância e pastorícia na disputa dos melhores solos, “são todos causas profundas da insegurança alimentar”, afirmou.
Admitindo que a prioridade da União Africana é promover a segurança e autossuficiência alimentar, Josefa Sacko explicou que a organização tem apelado aos Estados-membros para investir 10% dos seus orçamentos nessas metas, seja na produção agrícola, agropecuária ou pescas.
“Os países devem especificar os indicadores estatísticos. Se não estão a colocar é porque não estão a investir” nessas áreas, avisou a comissária, numa referência ao facto de muitos países alegarem não terem condições para gastar essas verbas.
A invasão da Ucrânia elevou o preço dos cereais e mostrou a fragilidade do continente, alertou, sublinhando que o continente depende de cereais de Kiev e de fertilizantes da Rússia.
“Estamos dependentes dos dois”, admitiu, mostrando-se preocupada com a ausência de produção de “cereais, soja, milho, trigo e arroz” no continente, elogiando a capacidade de produção de países como a Ucrânia.
“África é um importador de comida. Não podemos entender como é que um continente com 1,4 mil depende de um país de 43 milhões. Deve-nos envergonhar”, considerou.
Sobre as alterações climáticas, Josefa Sacko contestou quem considera que esse fenómeno é falso e deu o exemplo de Moçambique, que tem enfrentado ciclones, cheias e secas sucessivas nos últimos anos, a que se soma a erosão costeira.
“O Presidente [Filipe] Nyusi é o campeão a enfrentar desastres naturais. O impacto das alterações climáticas existe, não tenham dúvidas. Não é um problema só europeu ou dos países mais desenvolvidos”, afirmou Sacko, dando o exemplo da perda de produção de gado devido à seca.
“A pastorícia está a morrer e isso tem consequências. É um tema em agenda e temos de tratar disto”, considerou.