Como se explica que a PGR não faça nada para “investigar e impedir” o negócio sobre aquisição do edifício Welwitschia Business Center (WBC)?

A Federação Internacional da Cruz Vermelha e as Sociedades do Crescente Vermelho lançaram, recentemente, um apelo internacional para a angariação de oito milhões de dólares destinados a acudir a crítica situação de fome no Sul de Angola. Por seu lado, o governo aguarda, esta semana, pelo visto do Tribunal de Contas para finalmente pagar 85 milhões de dólares por um edifício de valor e utilidade altamente duvidosos.

Em Novembro passado, apresentámos uma queixa-crime a respeito da aquisição do edifício Welwitschia Business Center (WBC), por parte do ministro dos Transportes, Ricardo Veiga D’Abreu, ao seu amigo de infância Rui Óscar Ferreira Santos Van-Dúnem, pela quantia de 91 milhões de dólares americanos, conforme Despacho Presidencial n.º 159/21 de 23 de Setembro.

Na participação judicial à Procuradoria-Geral da República (PGR), alegou-se que o edifício era inadequado para a função que se pretendia que desempenhasse. Parte do mesmo edifício destina-se à habitação. A queixa apresentada realçou o valor aparentemente empolado do edifício. Os valores excessivos envolvidos nesta operação de compra e venda, de acordo com a queixa, ficaram a dever-se à amizade e às relações de compadrio entre o ministro comprador e o amigo vendedor.

A PGR anunciou que iria proceder à investigação, embora mais tarde, a despropósito, tivesse afirmado que esta afinal poderia ser arquivada: sem fundamentar, sem se comprometer.

Certo é que, até hoje, não há notícia pública sobre o resultado de tal investigação. Mas há informação fidedigna segundo a qual o Tribunal de Contas se prepara para autorizar, justamente esta semana, a realização do pagamento. Fonte do Ministério das Finanças garante que os 85 milhões de dólares serão pagos em duas tranches. A primeira com Títulos do Tesouro, a outra com recursos ordinários da conta do Tesouro. Ou seja, os contribuintes, em vez de pagarem solidariamente com os seus impostos o alívio da fome no Sul de Angola, pagam por um prédio para alimentar vícios e vaidades que transformam o erário público numa conta privada.

A mesma fonte de informação dá conta de objecções iniciais do Ministério das Finanças ao negócio, tendo embora acabado por sucumbir a ordens superiores, dando-lhes cumprimento. Por sua vez, a PGR não usou os meios legais ao seu alcance para suspender ou congelar o prosseguimento de mais um dispêndio ruinoso para o Estado angolano, que enferma, de resto, de vários indícios de corrupção.

Portanto, em vez de uma investigação com despacho de acusação ou arquivamento, estamos perante um aparente vazio judiciário. Isto coloca-nos na posição de temos a possível consumação de um crime debaixo do olhar de todos.

Como se explica que o Ministério das Finanças tenha aceitado este negócio, mudando de posição sem mais?

Como se explica que a PGR não faça nada para investigar e impedir o negócio?

Pode-se ponderar a ilibação de Ricardo Abreu das suspeitas sobre si recaídas, mas é inaceitável a não existência de um despacho clarificador do PGR sobre um assunto que, aliás, seria passível de recurso.

Só depois de passados os prazos respectivos haveria legitimidade legal e moral para avançar com os pagamentos. Até lá, estamos a assistir a um atropelo das normas jurídicas e do bom senso institucional.

O anterior PGR, o general João Maria de Sousa, tratava a justiça de forma trungungueira, como a lei de Darwin – a sobrevivência dos mais fortes. Todavia, nesses casos de bastante publicidade, cuidava publicamente de mandar arquivar as denúncias. Pelo menos, era legalista na protecção dos actos de corrupção.

A comunidade política e a sociedade em geral têm de sentir que o combate à corrupção não poupa ninguém e abrange todos. E, sobretudo, que os processos têm princípio, meio e fim, e não desaparecem simplesmente ou se engasgam a certo passo.

A ministra das Finanças Vera Daves não pode pensar que não deve explicações à comunidade quanto à conformidade e transparência dos procedimentos. Temos de ser exigentes com as instituições e clamar permanentemente por fundamentações e transparência adequada nas decisões. Não se pode deixar cair os assuntos no esquecimento e depois fazê-los desaparecer por “milagre”. Assim, lançamos daqui o repto para que este tema seja definitivamente esclarecido e para que seja publicamente conhecida a posição da ministra das Finanças e do PGR.

 

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