Presidente francês quer aumentar de 33 mil milhões USD para 100 mil milhões USD os valores alocados a África no âmbito da emissão de 650 mil milhões USD em Direitos Especiais de Saque. O objectivo é fornecer aos países africanos mais liquidez para enfrentarem a crise provocada pela COVID. Se Emanuel Macron for bem sucedido nesta sua missão, Angola poderá receber o triplo dos 1 40 milhões USD actualmente previstos.
Angola poderá receber 3 120 mil milhões USD com emissão de Direitos Especiais de Saque (DES) pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) caso seja aceite a proposta do presidente francês, Emmanuel Macron, durante a Cimeira de Paris sobre o financiamento das economias africanas, de elevar de 33 mil milhões USD para 100 mil milhões USD as verbas destinadas ao Continente.
Os DES são uma espécie de moeda do FMI que é emitida em situações especiais como a actual crise provocada pela COVID-19. Uma vez emitida a moeda é distribuída pelos bancos centrais (BC) dos Estados-membros na proporção das suas quotas. Os BC podem usar os DES para reforçar as suas reservas internacionais ou podem repassá-los a outro BC em troca de divisas fortes como USD ou Euros pagando uma taxa de juro de 0,5%.
O FMI aprovou em Abril a emissão de 650 mil milhões USD em DES dos quais 33 mil milhões USD serão alocados a BC africanos. A África Subsariana fica com 23 mil milhões.
Angola tem uma quota de 0,16% no FMI, o que quer dizer que se a instituição emitir 650 mil milhões USD em DES alocará ao BNA 1.040 milhões USD em DES que os pode transformar em moeda forte.
Na Cimeira de Paris, Emmanuel Macron manifestou o desejo de elevar para 100 mil milhões USD os DES alocados a África sem que isso implique a emissão de mais moeda do FMI. O presidente francês pretende simplesmente “desviar” parte dos DSE dos países ricos para os países africanos para dar mais liquidez para enfrentarem a crise.
Como os países ricos têm as maiores quotas no FMI são quem mais recebe. Por exemplo, a França tem direito 27,56 mil milhões USD em DES com a emissão de 650 mil milhões de DES correspondentes à sua quota de 4,24% no FMI.
“A França está pronta para fazer isso”, garantiu o presidente francês sem adiantar qual o montante que pretende repassar para os países africanos. “Portugal e vários outros países que aqui estiveram presentes [na Cimeira de Paris] também estão (…) Assim, o nosso trabalho nas próximas semanas será o de convencer outros países a fazerem o mesmo esforço que a França, começando, naturalmente, pelos Estados Unidos da América [o maior acionista do FMI]”.
Se o presidente francês for bem sucedido nesta sua missão, Angola poderá receber 3 120 milhões USD em vez dos 1 40 milhões agora previstos. Isto caso a alocação dos novos 66 mil milhões USD (diferença entre os 100 mil milhões propostos por Macron e os actuais 33 mil milhões) se faça na proporção das quotas dos países africanos.
A emissão de DES foi pedida em Fevereiro deste ano por vários ministros das Finanças africanos, numa reunião virtual da Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA) com o objectivo de obter mais liquidez para responder à crise da COVID-19.
Além do aumento dos DES, os governantes africanos pediram também uma extensão da Iniciativa para a Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI), que prevê uma moratória de um ano, contado a partir de 1 de Abril de 2020, para os países endividados pagarem juros e amortizações, devido à natureza prolongada da pandemia.
A proposta africana foi adoptada pelo líder do Clube de Paris e ministro das Finanças de França, Emmanuel Moulin. Em entrevista à Bloomberg ainda em Fevereiro deste ano, o governante francês disse que membros do Clube de Paris iam propor nas reuniões de Primavera de 2021 do FMI e do Banco Mundial, em Abril, um aumento dos DES no mesmo valor reclamado pelos governos africanos, mas que foi bloqueado em 2020, pelo governo dos Estados Unidos ainda sobre liderança de Donald Trump.
A emissão de DES tem de ser aprovada por 85% dos votos, sendo que os EUA detêm poder de veto com os seus 16,51% de direitos de voto. Entretanto a administração Joe Biden reverteu a posição de Donald Trump.
Dinheiro deve servir para pagar dívida
Em entrevista à Bloomberg, à margem da sua participação na cimeira, o presidente do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), Akinwumi Adesina, defendeu que parte dos DES emitidos pelo FMI devia ser usada para os países africanos amortizarem dívida comercial, evitando uma crise da dívida em África. Mas o banqueiro foi mais longe e quer que o sector privado seja parte da solução para a dívida africana. “Precisamos de usar alguns dos DES para comprar alguma desta dívida comercial, mas também temos de encorajar o sector privado a participar no Enquadramento Comum [para o tratamento da dívida além da Iniciativa para a Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI)]”, disse Akinwumi Adesina.
O titular do BAD afirmou que “ actualmente a dívida de África é muito elevada, é como subir uma montanha a correr com uma mochila cheia de areia, esta questão não vai desaparecer a não ser que encontremos um mecanismo de comprar algum dívida do sector privado”.
A dívida pública do continente berço subiu de forma muito significativa desde a pandemia, não só pela quebra de receitas originada pelo abrandamento da procura global, mas também pelo necessário aumento da despesa pública para conter a propagação da COVID-19. O rácio da dívida pública africana face ao Produto Interno Bruto (PIB) subiu 10 pontos percentuais (pp) de 60 para 70% este ano, segundo as previsões do FMI.
O FMI estima que os países africanos tenham necessidades de financiamento equivalentes a 450 mil milhões USD até 2025, daí a ideia de aumentar de forma massiva a ajuda de emergência a África, que sofreu tanto como os outros países, mas não tem os instrumentos financeiros que os países mais desenvolvidos colocaram à disposição das suas economias.
Os países africanos já beneficiaram de um perdão de dívida nos anos 1990, quando uma iniciativa conjunta do FMI e do Banco Mundial para os Países Pobres Altamente Endividados reduziu significativamente o montante a pagar.
Entre 2006 e 2019, a dívida externa africana passou de 100 mil milhões para 309 mil milhões USD. Com a crise do novo coronavírus levou boa parte da região para uma recessão económica que torna muito mais difícil o cumprimento das obrigações financeiras.