Profissionais de saúde pediram hoje a intervenção do Presidente angolano para “travar” a escassez de materiais descartáveis, medicamentos e de recursos humanos nas unidades sanitárias, sobretudo em Luanda, que registam enchentes e mortes nos bancos das urgências.
Segundo profissionais ouvidos pela Lusa, o sistema de saúde primário, sobretudo na capital angolana, “colapsou” e as unidades hospitalares estão a registar em “média entre seis e dez mortes” associadas à malária e anemia.
“Com todas as observações que temos feito não observamos melhorias nem de medicamentos, nem de recursos humanos e meios e o que me admira é o silêncio do Presidente da República, João Lourenço, em relação a isso”, afirmou hoje o presidente do Sindicato Nacional dos Médicos de Angola (Sinmea), Adriano Manuel.
Para o médico Adriano Manuel, “é necessário que os altos dirigentes do país, sobretudo o Presidente da República, façam visitas surpresa aos hospitais públicos para observarem o que se passa verdadeiramente e quais as repercussões”.
O lixo e as águas paradas, de esgotos a céu aberto e das últimas chuvas, referiu o dirigente sindical, “influenciam negativamente” o quadro sanitário de Luanda verificando-se um “elevado quadro de malária nos bancos das urgências”, notou.
“Estamos num quadro em que grande parte das crianças padecem de má nutrição crónica, por um lado, e de anemia crónica também, e quando a malária acomete esses pacientes encontra uma certa vulnerabilidade e daí surgem as mortes”, disse.
Ao quadro de malária associam-se as anemias e insuficiências dos ‘stocks’ do banco de sangue. “Daí que muitas crianças que acorrem aos nossos hospitais morrem de malária”, lamentou Adriano Manuel, em entrevista à Lusa.
O presidente do Sinmea estimou igualmente que, em média, o índice de mortalidade por malária nas unidades hospitalares “varia entre 06 e 10 mortes por dia, embora existam hospitais que tenham um nível superior e atingem mais de 18 mortes de crianças”.
“Isso acontece porque os níveis secundários e primários não têm recursos humanos e medicamentos e, então, as pessoas acorrem aos hospitais terciários por falta de condições para a aquisição de medicamentos”, sublinhou.
Apontou ainda “um visível desgaste físico geral de médicos, enfermeiros e demais técnicos de saúde, em consequência da demanda de pacientes”, o que também influencia, frisou, “o índice de mortalidade”.
Porque, explicou o médico, “não se pode compreender como é que um médico sozinho num banco de urgência observa uma média de 150 doentes”.
“É um cansaço terrível e infelizmente o Governo faz ouvidos de mercador”, comentou.
O cenário de enchentes nas unidades hospitalares, a partir do nível primário, foi também relatado pelo secretário-geral do Sindicato de Técnicos de Enfermagem de Luanda, Afonso Kileba, afirmando que a procura dos doentes “contrasta com a escassez de técnicos de saúde”.
“Os hospitais estão muito cheios, centros de saúde muito cheios, principalmente do nível primário, onde está a maior parte da população e é o nível que está desfalcado em termos de técnicos”, disse hoje Afonso Kileba.
Em declarações à Lusa, o responsável sindical e especialista em enfermagem lamentou também a “inexistência” de materiais descartáveis nas unidades sanitárias, referindo existir uma “redução de abastecimento do material gastável” nos hospitais de Luanda.
“Há hospitais a que estão a ser atribuídas cinco ampolas de dipirona [fármaco para a febre] para um mês, de tal maneira que agrava também o quadro de mortes, devido à ausência de uma resposta capaz”, indicou.
Quanto a condições de trabalho, “já nem se fala, não existe alimentação ou condições de acomodação dos técnicos”, atirou ainda Afonso Kileba.