O Representante do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Angola disse hoje que a insegurança alimentar no país africano “ainda é relevante”, com grande número de pessoas a sofrerem de “forma desmedida” e “50% de crianças em inanição”.
Segundo Marcos Souto, apesar de Angola, neste momento, não ter problemas de limites orçamentais em função das condições globais, pelo facto de o preço do petróleo trazer receitas extras ao país, a insegurança alimentar no país “ainda é significativa”.
“De qualquer forma o problema da insegurança alimentar em Angola ainda é infelizmente relevante, fiquei surpreso quando comecei a trabalhar com Angola por uma série de motivos, mas um dos motivos foram os indicadores sociais”, afirmou o representante do FMI.
Para um país “com a grandeza de Angola, com as riquezas de Angola, com os potenciais de Angola, nós vimos um grande número da população, uma grande parcela da população a sofrer de uma forma desmedida, números que escutei 50% das crianças sofrem de inanição”, apontou.
Essas crianças, salientou, “terão permanentes limitações de natureza cognitiva, porque uma vez que este processo acontece, em uma determinada idade, isso tem um impacto no desenvolvimento do cérebro e as funções cognitivas não se recuperam mais”.
“Nós temos que lembrar disto, porque qual é o futuro que queremos para Angola? É um futuro onde haja mais oportunidades para todos, é um futuro onde esse tipo de número não seja mais uma realidade, temos aqui ainda desafios muito grandes”, notou.
O representante do FMI em Angola, que falava em Luanda, na apresentação do Relatório sobre as Perspetivas Económicas Regionais da África subsaariana do FMI, defendeu um desenvolvimento “mais virtuoso e mais inclusivo” para os angolanos.
Marcos Souto recordou a “história de sucesso” enfrentada por Angola nos últimos “três anos difíceis”, por conta da pandemia, com o país a emergir com coragem para continuar com as reformas e mudanças desafiadoras, insistindo que a “sua grandeza deve ser refletida nos cidadãos”.
Mas, Angola “demonstrou que é um país com uma grandeza que não cabe dentro da sua geografia e essa grandeza, agora, precisa de se traduzir também em mudanças que melhorem a vida do seu cidadão”, realçou.
“Pessoas que não têm acesso à educação, sem acesso ainda a questões estruturais básicas, mas eu tenho a mais absoluta certeza de que da mesma forma que Angola teve a força, a coragem para emergir da situação em que estava também o fará nesse processo agora de diversificação económica”, sustentou.
Defendeu também a criação de oportunidades para os cidadãos angolanos, num círculo mais virtuoso.
“Porque, à medida que estas pessoas começam gradativamente a migrar para a economia formal, em que há menos fome, isto cria as condições para um ciclo de desenvolvimento mais virtuoso e principalmente mais inclusivo”, insistiu.
Pelo menos 123 milhões de pessoas na África subsaariana estão em situação de insegurança alimentar, recordou Marcos Souto, aludindo aos dados do relatório, referindo que o “aumento dos preços de bens alimentares e da energia coloca muitas vidas em risco”.
A resolução deste problema “é uma clara prioridade, mas a capacidade de expandir rapidamente as redes de segurança social é limitada em muitos casos, já estava bastante difícil em função dos efeitos da pandemia”, afirmou.
“Pelo que alguns países optaram em se virar para medidas de apoios dispendiosas e mal direcionadas, na atual situação de emergência estas medidas são necessárias, sobretudo os programas de apoio alimentar”, ressaltou.
“Mas, deverão ser eventualmente e progressivamente eliminadas e substituídas por alternativas mais bem direcionadas, assegurando que os escassos recursos vão para aqueles que mais deles necessitam”, apontou.
Um cenário, sublinhou Marcos Souto, que não se aplica a Angola, “que felizmente não tem esse problema devido às receitas extras do petróleo”, mas a países da região que sofrem neste momento de limites grandes dentro dos seus orçamentos em função das condições globais”.
O FMI estimou igualmente em 3,6% a expectativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para a África subsaariana em 2022 e uma taxa de inflação de 18% para Angola até final deste ano.
Segundo ainda o FMI, os países da África subsaariana necessitam de ajustar os seus orçamentos para estabilizar a dívida em percentagem do PIB abaixo de 70%.
O limiar de 70%, observa o relatório, “representa o terço superior de países”. Para os países acima deste valor, acrescenta-se, “o ajustamento estabiliza a dívida no nível final de 2021”.
A cerimónia decorreu no auditório do Museu da Moeda, em Luanda, e foi organizada pelo FMI em parceria com o Banco Nacional de Angola (BNA).