A derrota acontece na sequência de um recurso apresentado pela empresária angolana. Um triunfo da liberdade de expressão, entendem alguns. Em causa estavam tweets supostamente difamatórios da ex-eurodeputada portuguesa.
O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17 de junho de 2021, confirma a sentença em primeira instância. O julgamento decorreu no Tribunal de Sintra, em 2019, por queixa-crime apresentada por Isabel dos Santos contra Ana Gomes, acusada de difamação.
A política portuguesa, que nesse mesmo ano tinha apresentado queixa contra a empresária angolana por alegadas práticas de branqueamento de capitais, mostra-se agora satisfeita com a decisão do tribunal.
“Claramente, esta foi uma ação para intimidar quem tem exposto e denunciado a cleptocracia angolana e em particular da família dos Santos”, entende Ana Gomes.
A ex-eurodeputada comenta ainda que “foi um processo lançado por Isabel dos Santos pouco antes de sair o “Luanda Leaks” e foi significativo que a decisão na primeira instância, portanto, no Tribunal de Sintra, tenha sido já também emitida contra ela, considerando que eu tinha atuado de acordo com a lei”.
À DW África, Gomes repete as acusações contra a “ex-princesa” angolana: “Isabel dos Santos pôs-me uma ação para eu retirar “twittes” meus onde eu expunha que o banco que ela detinha e ainda detém – o EuroBic – era uma verdadeira lavandaria, isto é, era uma máquina de branqueamento de capitais, designadamente dos capitais que ela desviava do erário público angolano, à conta das suas relações privilegiadas como pessoa politicamente exposta, filha do [antigo] Presidente da República em Angola”.
“Eu pecava por defeito”
Mas a investigação no âmbito do “Luanda Leaks”, para além da ação da justiça portuguesa, veio a demonstrar que Ana Gomes tinha razão.
“Aliás, eu pecava por defeito. Eu tinha conseguido expôr uma teia de 40 empresas através das quais Isabel dos Santos construía o esquema de ecrãs para ofuscar a proveniência corrupta do seu dinheiro. O “Luanda Leaks” veio expor que não eram 40. Eram cerca de 400 empresas”, acrescenta.
O acórdão de cerca de 30 páginas, endereçado a Francisco Teixeira da Mota, advogado de Ana Gomes, também é comentado por Paulo de Morais. O antigo candidato presidencial e líder da Frente Cívica Anticorrupção considera que a decisão do Tribunal da Relação representa uma nova vitória da ex-eurodeputada.
Triunfo da liberdade de expressão
Para Paulo de Moraes, trata-se sobretudo do triunfo da liberdade de expressão, por Ana Gomes ter denunciado a estrutura de enriquecimento ilegítimo de Isabel dos Santos, bem como os esquemas de lavagem de dinheiro montados em Portugal.
“Ana Gomes condenou ainda a atitude colaboracionista do Estado português com o desvio dos dinheiros que têm vindo a ser subtraídos ao povo angolano. Fez um conjunto de denúncias na defesa do interesse público”, entende.
Para o ex-líder da Frente Cívica, a política “tem direito a fazê-lo no uso de um direito constitucional, que é o direito de liberdade de expressão, pelo que esta derrota de quem tentou cercear este direito, neste caso esta nova derrota de Isabel dos Santos, é uma boa notícia, pelo menos para já”.
Ana Gomes sai definitivamente ilibada das acusações feitas pela filha de José Eduardo dos Santos, tendo sido determinado pelo tribunal que a empresária pague as respetivas custas ao abrigo do processo cível julgado em 2020.