A acusação sustenta que Carlos São Vicente foi diretor de riscos da Sonangol até 2016, circunstância que o ajudou a praticar atos ilícitos. Documentos mostram que abandonou o cargo em 2005 e quis vender a seguradora AAA à petrolífera.
A acusação a Carlos São Vicente possui duas fragilidades que poderão ser usadas pela defesa do líder da AAA para enfraquecer a narrativa construída pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola. São Vicente foi constituído arguido em setembro do ano passado sob acusação de peculato, tráfico de influências e branqueamento de capitais e está desde então em prisão preventiva.
O caso foi desencadeado em agosto quando a justiça suíça decidiu congelar 900 milhões de dólares da conta de Carlos São Vicente por suspeitas de lavagem de dinheiro. Posteriormente, a PGR decidiu instaurar um processo contra o empresário.
Segundo a acusação, o empresário desempenhou entre 2000 a 2016, em simultâneo, as funções de diretor de gestão de riscos da Sonangol e de presidente do conselho de administração da companhia AAA Seguros, sociedade em que a petrolífera era inicialmente única acionista, e terá levado a cabo naquele período “um esquema de apropriação ilegal de participações sociais” da seguradora e de “rendimento e lucros produzidos pelo sistema” de seguros e resseguros no setor petrolífero em Angola, graças ao monopólio da companhia.
Ora, de acordo com documentos a que o Negócios teve acesso, Carlos São Vicente abandonou a direção da gestão de riscos da Sonangol a 29 de novembro de 2005, uma decisão que consta de um despacho assinado por Manuel Vicente, então presidente da petrolífera. Na mesma data, a administração nomeia Maria de Fátima Alves para o cargo de diretora de gestão de riscos. O lugar, até 2016, é ocupado, pelo menos, por mais três pessoas. João Matias (2007-2009) e Walter do Nascimento (2009-2013), ainda indicados por Manuel Vicente. Em 2013, a direção passa a ser assegurada por Alberto Severino Pereira, já indigitado pelo atual presidente, Francisco Lemos. Esta circunstância mostra, assim, que terá sido impossível a São Vicente, exercer os dois cargos em simultâneo durante o período referido pela PGR.
Outro elemento a reter é o de Carlos São Vicente, de acordo com a acusação, se ter apropriado da maioria do capital da seguradora AAA. Também aqui a história tem um outro lado, o de a Sonangol sempre se ter recusado a participar nos aumentos de capital da seguradora e não a ter comprado quando o empresário se propôs vendê-la.
Aliás, a Sonangol declinou mesmo a possibilidade de tomar o controlo da AAA. “Não há, da parte da Sonangol, intenções presentes e/ou futuras em diversificar a sua matriz de negócios, nem tão-pouco penetrar na indústria seguradora e resseguradora, pelo que a aquisição da AAA foi rejeitada”, lê-se numa carta da Presidência da República assinada por Aldemiro Vaz da Conceição, na condição de secretário em exercício dos assuntos judiciais e jurídicos da Casa Civil, datada de 20 de fevereiro de 2013.