Novo Banco, BCP e Caixa reclamam verbas financiadas em 2015 à Winterfell 2, no quadro da operação de compra da Efacec por Isabel dos Santos. Querem ficar com eventual indemnização do Estado pela nacionalização
O Novo Banco, o BCP e a Caixa Geral de Depósitos (CGD) avançaram esta quarta-feira com duas ações de execução sobre a Winterfell 2, a sociedade de Malta controlada pela empresária angolana Isabel dos Santos que detinha a maioria do capital da Efacec até esta ser nacionalizada pelo Estado português.
Ora, o objetivo das três instituições financeiras portuguesas, sabe o Expresso, é assegurar o direito à futura indemnização da nacionalização da Efacec, uma vez que os bancos que tinham penhor sobre as ações da empresa serão beneficiários da indemnização até ao limite do valor dos respetivos créditos garantidos.
Numa das ações, apresentada pelos três bancos, estão em causa 18,5 milhões de euros. Na outra ação, que junta apenas o Novo Banco e o BCP, o valor é de 10,3 milhões de euros, segundo a informação publicada no portal Citius.
O valor em disputa é muito próximo do valor com que estas três instituições financeiras financiaram em 2015 a Winterfell 2 para a compra da Efacec (na altura o negócio previa a aquisição de 72%, permanecendo o restante capital na MGI Capital, detida pelas portuguesas Têxtil Manuel Gonçalves e José de Mello).
Isabel dos Santos avançou para a compra da empresa portuguesa de equipamentos de energia através de uma estrutura em Malta encabeçada pela sociedade Winterfell Industries, detida em 60% por Isabel dos Santos através da Niara Holding (da Zona Franca da Madeira) e em 40% pela estatal angolana ENDE.
A compra da Efacec custaria a Isabel dos Santos 195 milhões de euros. A empresária angolana estruturou a aquisição da seguinte forma: a estatal angolana ENDE avançaria 40 milhões de euros (pelos 40% na Winterfell Industries), que seriam a componente de capitais próprios do negócio; e caberia a Isabel dos Santos angariar os restantes 160 milhões em financiamento bancário.
Novo Banco, BCP e CGD acordariam em financiar a Winterfell Industries em 40 milhões e a Winterfell 2 em 30 milhões de euros. A esse montante juntar-se-iam os financiamentos à Winterfell do Montepio (40 milhões), BPI (25 milhões) e BIC (25 milhões).
O Expresso contactou os três bancos, bem como a assessoria de imprensa de Isabel dos Santos, para obter comentários sobre estes processos de execução, mas não foi possível obter respostas imediatas de nenhuma das partes.
Também não foi possível obter resposta de Mário Leite da Silva, gestor que durante vários anos liderou a Fidequity e representou os interesses económicos de Isabel dos Santos. Mário Leite da Silva renunciou em maio deste ano aos cargos de administração que tinha na Winterfell 2 e na Winterfell Industries, duas sociedades maltesas criadas em 2015 para estruturar a compra da Efacec por Isabel dos Santos. A renúncia do gestor foi publicada em setembro último no registo comercial de Malta.
E não foi apenas o seu gestor português que Isabel dos Santos perdeu. Também perdeu rapidamente o apoio da banca. No caso da Winterfell, os bancos avançaram para a execução em conjunto e meses depois da nacionalização da Efacec, quando os problemas da sua proprietária, a Winterfell II, se tornaram claros. Um contraste com a execução em conjunto que os mesmos três bancos fizeram, por exemplo, em relação ao universo de José Berardo, que só aconteceu em 2019, depois de anos em que os empréstimos concedidos ao empresário madeirense já faziam soar alertas nas instituições financeiras.
INDEMNIZAÇÃO DA NACIONALIZAÇÃO AINDA POR APURAR
Depois das revelações do Luanda Leaks, em janeiro, e do processo encetado um mês antes pelo Governo angolano para o arresto de participações de Isabel dos Santos, o império da empresária angolana começou a ruir, com constrangimentos financeiros e o progressivo afastamento de alguns dos seus gestores e assessores de longa data. A instabilidade chegou à Efacec, uma das empresas portuguesas em que Isabel dos Santos apostou (a par com a Galp Energia, de forma indireta, e a NOS).
O Governo português decidiu nacionalizar a Efacec no início de julho deste ano, anunciando desde logo a intenção de a reprivatizar (um processo que tem sido demorado). Nesse mês o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, avisou no Parlamento que a indemnização – caso venha a ser determinado que tem de existir – seria paga a quem provasse ser o dono da Efacec. E será justamente isso que os três bancos portugueses estão a tentar assegurar com estas ações de execução: o direito a receber a compensação que vier a ser definida.
“O Estado, após a nacionalização da Efacec, tem de promover uma avaliação da empresa e pagar uma indemnização pela participação que adquiriu. Essa indemnização será paga a quem provar pertencer-lhe”, declarou Siza Vieira no Parlamento a 7 de julho.
Nessa ocasião o governante lembrou que existe “um conjunto de bancos” com penhor sobre as ações da Efacec detidas pela Winterfell, para garantia dos empréstimos concedidos à empresa de Malta. E, além disso, há o interesse do Estado angolano, acionista minoritário da Winterfell Industries.
As empresas escolhidas para a avaliação da indemnização da nacionalização foram a Baker Tilly e a PKF.
Mas Isabel dos Santos não se dá por vencida. A empresária angolana, através da Winterfell, também avançou com uma ação de impugnação da nacionalização, classificando-a como “discriminatória”, por incidir apenas sobre a participação acionista da Winterfell e não incluir a posição minoritária portuguesa.
A Efacec projeta para este ano receitas de aproximadamente 300 milhões de euros. Em 2018 chegou a faturar quase 400 milhões de euros.
Texto do Expresso