A socióloga angolana Tânia de Carvalho afirmou, em entrevista à Angop, que Angola, apesar de independente, é um país completamente dependente do estrangeiro, fez homens muito fortes e esvaziou, com isso, as suas próprias instituições.
A socióloga defende, entre muitas questões, que os angolanos têm o direito de construir, de facto, uma democracia com consciência, sublinhando que as liberdades devem ser exercidas sem, necessáriamente, partir o que já foi conquistado.
Nesta conversa com a jornalista Stella Silveira, ainda por ocasião dos 45 anos da independência nacional, assinalados a 11 de Novembro, Tânia de Carvalho fala sobre os múltiplos desafios do país, aponta soluções e revela as suas aspirações, deixando um recado à sociedade em relação aos direitos fundamentais – “as liberdades não podem ser negociadas”.
Eis a íntegra da entrevista:
Quem é Tânia de Carvalho?
Uma jovem mãe, jovem mulher, funcionária pública, que tem o privilégio de aparecer na televisão usando a sua voz e vez, para apresentar o seu ponto de vista sobre os problemas político-sociais marcantes. Quando temos filhos pequenos – e eu tenho dois, um de seis e outro de três anitos -, a nossa agenda é condicionada ao bem-estar deles. O nosso hobbie acaba por ser proporcionar-lhes todo o prazer, toda a satisfação, toda a brincadeira. Gosto de ler para eles.
Como consegue ser tão, socialmente, activa e ainda cuidar do lar?
Este é o desafio de ser mulher em pleno século XXI. A mulher angolana sempre teve esta complexidade de ser autêntica em múltiplas tarefas e saber que não somos robots, somos susceptíveis de falhar. Sou muito perfeccionista, cobro muito de mim e, quando acho que falhei, sinto-me mal, mas procuro nunca falhar no papel mais importante: eu escolhi ser mãe. Não foi uma imposição. Despertou em mim o relógio biológico. Eu queria ser mãe e fui.
Sou feliz, sou “casada”, e o meu companheiro é muito parceiro, é um bom pai.
Nasceu na Angola independente, é, portanto, filha da independência. Que significado tem esta conquista para si?
Tem um significado muito grande, porque a história fala e os nossos factos históricos são muito tangíveis. Tive o privilégio de conhecer alguns dos nossos nacionalistas (que são bibliotecas vivas e que ainda por aqui andam), ainda que pela comunicação social, e outros através de actividades realizadas na União dos Escritores Angolanos, bem como por meio de outras que nos fazem conhecer figuras como Lúcio Lara. Ouvir deles a envolvência que tiveram na luta de libertação, como era Angola antes da independência e saber que lutaram de forma desinteressada, doaram a sua vida e a sua juventude para termos uma Angola liberta também tem um significado muito grande. Hoje somos donos do nosso próprio destino, e o mundo reconhece que temos competências emocionais, jurídicas, políticas e mais algumas para cuidar do nosso destino, da nossa essência. Este é um ganho que não tem como não respeitar, não valorizar e não agradecer aos nacionalistas que deram a vida para tal.
Qual pensa ter sido o maior ganho da conquista da independência?
A nossa soberania, a nossa maturidade, a capacidade e a possibilidade de sermos donos do nosso destino. Parece algo poético, sobretudo quando estamos a fazer a leitura dos nossos símbolos nacionais, fundamentalmente da bandeira, e a tentar desmistificá-los, a importância e o significado das cores, dos símbolos e perceber que as pessoas nasceram e não conseguiam viver plenamente na sua própria terra; eram refugiadas na sua própria terra; eram maltratadas; não eram donas de nada nem de si, mas hoje têm a possibilidade de dizer: “eu posso, eu mando, eu consigo, eu sou igual a ti, porque a minha constituição assim o diz”. Isto não tem preço.
As frases “vão saber como se ganha uma bandeira, vão saber o que custou a liberdade” fazem algum sentido para si?
São frases muito fortes, que me mantêm curvada – obrigam-me a fazer uma vénia – por todo o trajecto que teve a nossa luta de libertação nacional. Nós, os jovens, não podemos ser ingratos com o que já foi conquistado, não temos o direito de questionar a entrega abnegada e desinteressada que os nossos nacionalistas tiveram, antes pelo contrário, temos a responsabilidade de manter essa conquista, trabalhar mais e melhor por uma Angola desenvolvida de forma sustentável, que seja capaz de albergar os seus filhos, para que não tenham a necessidade de viver em solo alheio, para que sejam capazes de lhe conferir felicidade e não só pelos recursos naturais, mas também porque ela nos basta. Só precisamos de não ser egoístas e de perceber que não devemos tirar só para nós e para os nossos, devemos partilhar. Nós, os jovens, temos a responsabilidade maior. O país está entregue a nós, e as lutas estão aí para ser feitas.
Os nossos filhos e os filhos dos jovens de hoje vão perguntar o que fizemos para resolver os problemas que não foram resolvidos.
Os mais velhos fizeram a sua parte, numa altura em que as lutas, as ferramentas e os métodos eram outros. Agora, o que é que estamos a fazer?
A actual geração de jovens é muito crítica ao posicionamento da geração de jovens dos anos 80, que fez e viveu uma guerra. Quer comentar?
A geração dos anos 80 sabe muito bem as amarguras de uma guerra, de um conflito, não teve uma juventude ou infância condigna, porque nasceu e viveu num país em conflito; teve os seus sonhos vendidos e destruídos. Muitos dos jovens dos anos 80 tiveram de abandonar a terra para viver numa terra que nunca os acolheu, olhou para eles como estrangeiros que vieram estragá-la. Portanto, não estão dispostos, hoje, a perder esta estabilidade conseguida desde 1992.
Já a geração de 2000, que não sabe, na verdade, o que significa o conflito armado que tivemos por décadas (não vou dizer que esteja distraída, porque talvez seja próprio da idade), infelizmente é, facilmente, alienada e deixa-se influenciar. Quem opta pela confusão não é porque tem vontade. O país está mal, está.
Estamos com uma situação social cada vez mais difícil? Sim. Estamos a passar fome? Estamos a viver situações complexas? Sim, mas isso se justifica?
Estamos a falar das manifestações?
Sim. Estamos a provar o sabor da liberdade, e isso tem consequências. A abertura que nos foi dada tem consequências boas e más. Temos o direito de construir, de facto, uma democracia sem, necessariamente, partir o que já foi conquistado, mas é preciso inteligência emocional para nos estabilizarmos. Defendo que as liberdades não podem ser negociadas, não tenho de negociar a liberdade de reivindicar quando acho necessária. Ninguém mais nos pode tirar isso. Acho que temos de saber reivindicar, saber gritar. Isso é importante.
As sociedades são dinâmicas. A forma como a geração de 80 reivindicava não pode ser igual à reivindicação desta geração. Os problemas são outros e as motivações também. Temos de saber dosear e compreender-nos da melhor maneira possível.
Há quem defenda que o movimento reivindicativo é necessário, mas que os jovens estão a ser manipulados. Quer comentar?
Alguns jovens podem estar a ser influenciados, mas há muitos jovens que sabem o que querem. Claro que há forças externas neste movimento, porque há jovens que vivem lá fora há décadas e estão completamente descontentes com a situação, têm o seu direito de gritar, mas não é bom dizermos que estão a ser de todo manipulados. Estamos a viver um momento novo, não estávamos habituados a exercer, de facto, a liberdade de expressão que estamos a exercer. Ainda há muita coisa para ser aberta, mas já começámos a saborear isso. Tem de haver preparação dos dois lados, tanto do lado de quem governa quanto de quem está a ser governado. O momento é difícil para ambos, para nós que aprendemos a gritar agora e do lado de quem tem de abrir os ouvidos para ouvir-nos melhor.
Como pensa que tem sido conduzido este processo negocial?
Penso que precisava de um bocadinho mais de atenção. Soube que há pretensão (já aconteceu) de o Presidente da República se sentar com a juventude, principalmente a juventude mais proactiva, para a auscultação e busca de solução conjunta. Isso já é muito bom. Nunca é tarde, mas, se calhar, já devia ter acontecido. O diálogo é a chave para a solução de todos os problemas.
Será que a forma como se conduz este processo pode perigar o futuro da liberdade de expressão em Angola?
Se não tivermos cuidado, sim. As pessoas não podem ser silenciadas, não devem ser silenciadas. O direito à manifestação está consagrado na Constituição da República.
Considera-se uma activista política?
Penso que não. Quando procuramos rótulos e títulos, levantamos demais as expectativas por parte das pessoas, mas, quando não conseguimos, de facto, atingir o esperado, porque somos falíveis, acabamos por provocar decepções. Não quero decepcionar ninguém, sou uma cidadã que procura exercer o seu direito de cidadania. Se todos olharmos para nós nessa condição, não vamos esperar por maravilhas nem milagres de ninguém.
O que pensa ter faltado ao processo de desenvolvimento de Angola?
Fizemos homens muito fortes e, com isso, esvaziámos as nossas instituições. Temos hoje instituições fracas. Tínhamos o poder no bolso das pessoas. O Governo sequestrou este país e o sistema judiciário. Chegámos ao ponto de ter cidadãos a questionar acórdãos, questionar processos de julgamento, pessoas a sentirem-se mais importantes que magistrados, pessoas que entram num tribunal para negociar sentenças. O problema não está numa só pessoa, está em todos nós. A partir do momento em que concordamos que temos uma corrupção endémica, temos de perceber o que isso significa para a nossa sociedade.
Quando temos uma enfermeira a roubar a farmácia do hospital, não nos podemos preocupar, apenas, com o gestor público que comete o crime de branqueamento de capitais. O problema é muito mais grave do que percebemos.
Hoje temos outra figura na qualidade de Presidente da República, mas os problemas continuam. Às vezes, demitimo-nos da nossa responsabilidade, enquanto cidadãos, porque queremos esperar demais de quem gere este país, mas ele – o Presidente da República – não faz as coisas sozinho, nem deve, nem pode. Por mais que eu continue a defender a revisão da nossa Constituição, não é a solução para mudarmos o curso do país.
Então, qual é a solução e o que é urgente?
Temos de mudar de mentalidade. Os angolanos votaram no Plano de Governação que gizava a luta contra a corrupção. Até aí tudo bem! Como é que, a meio da governação, as pessoas acham que o Governo tem de recuar para negociar com quem roubou o país. Segundo o que a imprensa nos tem mostrado, conforme os documentos que vão vazando e mostram a forma como delapidaram o erário, saquearam o país. Essas pessoas são terroristas.
Não é uma expressão muito forte?
Não, não é muito forte. Pelo número de mortes, fruto da desgraça em que nos encontramos, é um acto de terror, só comparável a um genocídio. Repare no número de pessoas que morrem, ainda, de paludismo. E tivemos um julgamento de gestores da Saúde que tiraram o dinheiro que era canalizado para a malária e ficaram em casa, cumpriram pena suspensa. Só para entender como estávamos. As pessoas entendem que temos de negociar com eles; eles devolvem metade e ficam com metade. Isso é normal? Quem apresenta este tipo de sugestões ao Governo e porquê?
Quando se fala sobre movimentos reivindicativos, algumas vozes defendem que este tem uma direcção de fora de Angola cá para dentro. Quer comentar?
Não gostaria de levar a questão por esse caminho. Precisamos de encontrar soluções conjuntas para a satisfação das reivindicações dos activistas, daí que estaríamos a falar de soluções, do bem-estar de todos. Isso, para mim, interessa mais. A força dos descontentes (essa que vem de fora, de ex-governantes também) ainda é muito forte, uma vez que eles têm muito dinheiro, e dinheiro ainda é poder, mas temos mais do que eles. Quando falo de nós, é porque faço parte do povo e o povo é soberano. Temos o poder de escolha e de decisão de quem nos governa, temos a possibilidade de dizer basta e quando basta, de facto. Então, vamos olhar para dentro e encontrar soluções que sejam satisfatórias para todas as áreas. Considero que isso é o mais importante.
Tem fé na luta contra a corrupção?
TC – Se eu não tiver fé nisso, então não me adianta viver. De que forma é que vamos resolver este país se não abraçarmos, de facto, esta luta? Por mais que tenhamos alternância de Governo, venha um outro partido político, venha uma outra figura, o problema da corrupção é endémico em Angola. A solução tem de ser permanente. A luta não vai terminar agora. Nos próximos 10 anos, ainda vamos falar dessa luta.
Justifica-se o lema “ Corrigir o que está mal e melhorar o que está bem”?
Justifica-se. Nada é perfeito. Tem havido falhas, mas não posso perder a fé na minha Angola, não posso perder a esperança.
Quais os maiores desafios que Angola enfrentou nos últimos 45 anos?
Os desafios são muitos. Temos uma saúde doente e uma educação que, infelizmente, para quem acompanha o processo, e pelas inúmeras fases por que Angola passou, nos esquecemos do factor qualidade e optamos pela quantidade. O colono deixou este país com 85% da população iletrada. Primeiro, optámos por mandar os jovens para as brigadas de alfabetização, depois percebemos que tínhamos de fazer um trabalho mais intenso. Vivemos uma guerra civil que destruiu escolas, infra-estruturas, matou muitos quadros; optamos pela quantidade em detrimento da qualidade, com muitos doutores, e ninguém mais fez opções de cursos técnico-profissionais. Temos um problema muito grave, muito grande. Se olhássemos para os sectores da Educação e da Saúde como deve ser, metade dos nossos problemas estaria resolvida; se cuidássemos da agricultura e da indústria; se nos tornássemos auto-suficientes, de facto.
Somos um país independente, mas completamente dependente do estrangeiro, que até a água para beber vinha de Portugal, quando, na verdade, hoje já temos mais de 20 marcas de água mineral, pois alguém pensou e disse: “Não, calma, nós podemos”. Fizemos uma governação que só tirou os colonos fisicamente daqui, mas continuávamos a ser a dispensa deles. Os nossos políticos venderam o nosso país, tiravam daqui os bens e mandavam para lá, enriqueceram os povos lá fora em detrimento do povo angolano.
Angola tem hoje uma verdadeira oposição ao Governo?
Penso que não. Quando falo de oposição, não me limito ao maior partido na oposição, mas a todos os partidos, e todos eles juntos ainda são muito fracos, na minha opinião. Se o MPLA chegou ao ponto que chegou, foi porque a oposição permitiu, porque a oposição também se beneficiou e ainda se beneficia. Os partidos na oposição, com assento no Parlamento, também têm dinheiro do Orçamento Geral. O que fazem e qual é a agenda? Porquê que não nos revemos na agenda política dos partidos na oposição? A agenda dos partidos na oposição é criar guerrilhas nas redes sociais ou fazer contra-informação, não conseguem ter uma agenda que chame a atenção das mulheres, por exemplo, que são 52% da população.
Não me posso rever na agenda da oposição quando ela tem itens que não satisfazem os meus anseios (…). Eu sou mãe, quero olhar para a saúde materno-infantil, acesso à água potável, entre outros pontos.
Por falar em mulheres, considera que estão devidamente enquadradas na agenda governativa?
Ainda não, mas já se dão passos para lá. Há alguns anos, não tínhamos governadora; a primeira foi a de Luanda. Contudo, hoje já temos quatro num universo de 18, podíamos ter mais, se não tivéssemos a questão das quotas, em função dos acordos que Angola ratificou, podia ser pior. Baixou um bocadinho com a exoneração da ministra do Ambiente, mas sentimos alguma vontade, pois as mulheres vão sendo indicadas para posições-chave. Temos mulheres em sectores como Educação, Saúde, Finanças, podíamos ter na Defesa, mas ainda podemos vir a ter. Isto significa que podemos conseguir, de facto, o que merecemos. Realmente, não se percebe por que motivo num país onde 52% da população são mulheres se contam pelos dedos as que estão em cargos de chefia.
Há quem defenda que os poucos lugares ocupados por mulheres são decorativos, porque têm que justificar quotas.
Ninguém justifica quotas pondo mulheres em sectores fundamentais. Pôr uma mulher a dirigir a Saúde num momento de pandemia como este!? Podem até criticar, mas está a funcionar. Teremos, depois, tempo para fazer auditorias aos dinheiros disponibilizados.
Falamos de sectores como a Educação, no qual Angola precisa de fazer investimentos para melhorar significativamente. Não se faz isso só por decoração, mas também porque se acredita no seu potencial, no seu exercício e brio, o que vai fazer que outras mulheres sejam nomeadas para exercer funções noutras áreas. Penso que este país vai dar certo quando as mulheres ocuparem o seu lugar de verdade.
Será a juventude a resposta para a solução da governação?
Acho que a competência é a resposta. Como africanos, sabemos muito bem o que significa experiência de vida, e não conta apenas por contar, mas porque quantos mais anos de trabalho em determinado sector, maior é a sua capacidade de gestão emocional de crises, e faz-se então uma passagem de testemunho e de conhecimentos mais prazerosa, que nos dá conforto. Isto faz parte da nossa formatação cultural.
Se tivesse de assumir uma pasta no Governo, qual seria e porquê?
A de Presidente da República.
Não é muita ambição?
E porque me devia conformar com pouco? (risos) Obviamente que não seria agora, nem nos próximos cinco anos, talvez nem 10 anos. Preciso de crescer muito, estou a fazer uma caminhada para tal. Crescer e aprender com tudo e todos! Hoje já conheço o meu país inteiro, conheço as 18 províncias, sou uma eterna estudante, mas tenho sonhos e um dos meus sonhos é ser Presidente da República.
Acredita então que a solução de Angola está numa mulher?
Fundamentalmente. Desde que eu tenha os mais velhos ao pé de mim para me passarem toda a experiência e, sobretudo, a gestão emocional. Porquê que tenho de sonhar com menos? Mas atenção: fazer o percurso significa que posso aceitar tudo e todos. Eu, por exemplo, posso estar a servir cafés no meu local de trabalho e saber que amanhã alguém me vai servi-lo.
O que quero, na verdade, é poder contribuir da melhor maneira possível para o meu país. Acabei de dizer que gostaria de ser Presidente da República porque gosto de sonhar com o máximo, nunca com o mínimo; mas quero sempre estar numa posição onde eu consiga, de facto, contribuir mais e melhor para termos uma Angola desenvolvida. Não me importa onde estiver, sinto-me sempre satisfeita fazendo o que faço.
Penso que as pessoas deviam olhar para si desta forma, gostar do que fazem e deixar que a vida trace o nosso percurso.
O mundo e Angola, em particular, vivem uma crise sócio-económica agravada pela Covid-19 e pela insatisfação da população devido ao desemprego, à pobreza, bem como ao alto custo de vida. Como socióloga, o que pensa que poderia ajudar a atenuar a tensão social do momento?
Podemos atenuar a tensão social começando pelo diálogo, um diálogo de facto, e tirar um bocadinho das ideias de todos para construir um documento único. Quando falo de documento, significa encontrar soluções que possam satisfazer a todos.
A partir do momento em que uma mãe tem pão para dar aos filhos, ela tem metade dos seus problemas resolvidos. Não significa que só estamos preocupados com o hoje, mas queremos ver as questões básicas satisfeitas; não é ir ao hospital mas não haver fármacos, mas, sim, valorizar os nossos salários, entre outras condições. O Governo precisa de salvaguardar os postos de trabalho, fundamentalmente porque, se continuarmos a ter despedimentos em massa, vamos continuar a ter níveis de insatisfação maiores; se continuarmos a impedir as pessoas de fazer manifestações, vamos continuar a ter índices de insatisfação maiores.
O que podemos fazer para reduzir os excessos e minimizar os convívios para reduzir o número de vítimas da Covid-19.
O facto de durante décadas os angolanos acreditarem que são vítimas da situação social do país está na génese do nosso comportamento. Esta pandemia, entretanto, veio provar que, se nos esquecermos das nossas responsabilidades individuais, nada estaremos a fazer. O Governo faz a sua parte.
Faz os apelos, compra fármacos, mas a prevenção é da responsabilidade de cada um. Se pararmos para pensar quantas pessoas Angola perdeu este ano com a pandemia, vamos ver que quem perde somos nós e, se queremos ter um barómetro fiel do nível de consciência e de responsabilidade, aí está. Quando o Governo apela para ficarmos em casa, a juventude frustra-se por isso e depois atira pedras porque chega aos hospitais e não tem quem lhe vai atender, quando se está a avisar que o sistema de saúde está a colapsar. Alguns já estão a fazer o tratamento em casa; já estamos a ter casos de óbito em casa; portanto, quem quiser viver, quem quiser votar, em 2022, tem que se prevenir.
Ainda dentro dos festejos dos 45 anos de independência, que mensagem deixa aos angolanos?
Repensar na nossa essência. Ninguém vai resolver os nossos problemas por nós. Os outros só são combustíveis para atiçar o fogo ou abanar o fogareiro. A solução está nas nossas mãos. Temos de acreditar mais no nosso país, amar mais; temos de prestar atenção a esta terra que nos pertence.
Perfil
Tânia Luísa António de Carvalho nasceu em Luanda há 35 anos, é filha de uma família humilde de sete, por isso começou a trabalhar aos 14 anos de idade, tendo exercido vários ofícios, porque “crescer e aprender com tudo e todos” é o seu lema de vida.
A actual vice-presidente do Interclube de Angola para a área do Fomento Empresarial é licenciada em Ciências da Educação, na especialidade de Sociologia, pelo Instituto Superior de Ciências da Educação (ISCED) e pós-graduada em Pluralismo Social. Frequenta, presentemente, um mestrado em Gestão Empresarial.
Considera-se uma perfeccionista e cobra muito de si. Na sua caminhada pela vida é, também, comentarista do programa Política No Feminino da TPA (Televisão Pública de Angola), onde, segundo ela, usando a sua voz e vez, apresenta o seu ponto de vista sobre os problemas político-sociais marcantes.
Adora ler e comer. Hoje já cozinha, porque lhe dá prazer ver a família feliz.
Tânia de Carvalho