Angola: “Calado”, Paulo de Almeida é um poeta – Mariano Brás

A tragédia ocorrida na vila mineira de Cafunfo, município do Cuango, província da Lunda Norte, com efectivos da Polícia Nacional de Angola (PNA) e das Forças Armadas Angolanas (FAA), implacáveis na execução de compatriotas, é tão revoltante quanto condenável. A defesa da ordem constitucional está a servir de pretexto.

O massacre esconde a incompetência de um governo sem soluções para o país, para uma Angola em degradação a todos os níveis. As imagens, repugnantes, de cadáveres e pessoas feridas sem ajuda, postas a circular nas redes sociais, são uma demonstração de impunidade.

Foram captadas, como tudo indica, pelos mesmos agentes que negaram assistência a cidadãos caídos na sequência da violência.

Pensávamos que já tínhamos visto tudo em matéria de horror, de barbárie. Mas não. Surgiu, para o desconforto da opinião pública, o senhor Paulo de Almeida, “tão-somente” comandante-geral da Polícia Nacional de Angola, de quem se esperava um exercício com algum alento.

A sua deslocação ao local da “rebelião” prenunciava algo bem melhor, nada indigesto. Debalde. Optou por um discurso descontrolado, sem nunca ter respeitado a vida humana, sem diplomacia.

Angola esteve de ouvidos num comandante que deu mostras de falta de preparação para situações adversas. O seu discurso musculado e reles só é equiparado aos discursos sanguinários de Jonas Savimbi em tempo de guerra.

Quem conhece Paulo de Almeida diz que o mesmo não surpreendeu, não tendo sido a primeira vez a proferir pronunciamentos inflamados e absurdos.

Na altura dos desmaios nas escolas, só para lembrar, na condição de 2.º comandante-geral, disse que ocorriam por causa da fome.

Se naquela ocasião admitiu que a fome podia ser uma causa, já no caso da vila de Cafunfo não aceita qualquer justificação para os lundas reclamarem de melhorias sociais. E mais, Ameaça continuar a matar com “balas, bazucas e até mísseis intercontinentais”. Caso para dizer ‘brincadeira de um menino mimado com poder nas mãos’.

Senhor comandante, as revindicações do povo Tchokwe são de cariz económicas e sociais, nenhum mortal consciente aceitaria viver nas condições daquele povo sem reclamar.

As Lundas, tal como Cabinda, são uma grande mais-valia para o orçamento do Estado, mas há, paradoxalmente, problemas de água potável, energia eléctrica, escolas e tantos outros.

A estrada que vai em direcção a Catoca é inexistente. O governo angolano adoptou uma estratégia colonialista para os Tchokwe.

Por exemplo, a sede da maior empresa da região fica em Talatona, a nova cidade nobre de Luanda. Nas Lundas, não existe o reflexo das suas riquezas. Basta de hipocrisia, o problema das lundas é económico e social, e não militar.

Duvido que os pronunciamentos musculados de Paulo de Almeida não tenham o aval do PR, sendo certo que, em momentos como estes, o apoio político está sempre presente.

Estão justificados os frequentes envolvimentos de efectivos da PNA em casos de homicídios de pacatos cidadãos, como se de capins se tratasse, assim como a impunidade a que assistimos.

É importante dizer que a versão de tentativa de invasão à esquadra não colhe, se tivermos em conta que 300 homens armados para não mais de cinco efectivos dificilmente falhariam o “assalto”.

Relatos que nos chegam daquela província dão conta que os efectivos envolvidos no massacre da vila de Cafunfo serão promovidos como verdadeiros heróis nacionais. A que ponto chegamos!

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